Al Capone daria um excelente
candidato autárquico em Portugal,
numa primeira fase
apoiado por um partido
e, quando desse muito nas vistas,
como independente.
O fenómeno mais interessante da política local
é a atracção que os arguidos têm pelas autarquias.
As autarquias estão para os arguidos como aquelas
lâmpadas roxas dos restaurantes estão para as moscas.
Sem pretender ser ofensivo para as moscas,
a verdade é que o mecanismo é extremamente parecido.
Só não é igual porque, ao passo que as moscas falecem
quando tocam na lâmpada, os arguidos ganham
nova vida assim que entram na Câmara Municipal.
Não sei se o leitor tem conhecimento disto,
mas o termo autarquia provém de duas palavras gregas
que são muito difíceis de pronunciar.
Este é um primeiro ponto curioso.
O segundo ponto é que essas palavras significam
"comando de si mesmo", ou "governo de si mesmo".
Na origem, esse significado indica que uma autarquia
é o governo que determinada localidade
exerce sobre si mesma.
No entanto, alguns autarcas fazem uma interpretação
ligeiramente diferente, mas que não pode deixar
de se aceitar: na expressão "governo de si mesmo",
aquele "si mesmo" é o autarca.
É ele que, no sábio jargão dos taxistas, se governa.
E assim se regista um ponto de contacto entre
a etimologia grega e os modernos motoristas de táxi,
ligação que sempre suspeitei que existia.
A candidatura autárquica é o equivalente,
nos jogos de vídeo, às vidas infinitas.
Não há estrago da vida pessoal do candidato que
não possa ser resolvido com uma candidatura autárquica.
Penas de prisão, desemprego na família, despesas com obras:
não há mal que uma candidatura autárquica
não adie ou resolva. Sobretudo devido ao prurido democrático
que a maior parte dos eleitores tem em votar
num autarca que não seja arguido.
Se vivesse em Portugal, Al Capone nunca teria sido preso.
Em princípio, seria presidente de Câmara.
Os cidadãos não hesitariam em votar num homem
que, sendo famoso, tinha, além disso, demonstrado
saber criar emprego em várias áreas de negócio,
com especial destaque para as tão apreciadas
pequenas e médias empresas.
Desde as cimenteiras até às agências funerárias,
quase não há indústria que não tenha beneficiado
das actividades de Al Capone.
Não duvido de que daria um excelente candidato autárquico
em Portugal, numa primeira fase apoiado por um partido
e, quando desse muito nas vistas, como independente.
A única reserva que coloco ao sucesso de Al Capone
na política autárquica portuguesa é a consciência
do conhecido gangster americano.
Poderia dar-se o caso de Capone ficar inibido
com tanta vigarice e desejar voltar para Chicago.
Ricardo Araújo Pereira in Boca do Inferno (Visão)
sábado, 10 de outubro de 2009
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Brilhante e actual, como de costume.
ResponderExcluirRaios e coriscos, o moço escreve bem, tem piada e acerta nos alvos !
ResponderExcluirE além do mais, o RAP, a alma danada dos Gato, assuma-se ou não, tanto se me dá... escreve como escreve porque não rolou anteontem de debaixo de uma pedra qualquer.
ResponderExcluir(ISCSTE ou Nova, já não me lembro...)
Give them hell, Ricardo !!