segunda-feira, 8 de junho de 2009

O Eleitor

Era a primeira vez que ia votar.
Andava muito entusiasmado mas, em simultâneo, nervosissímo com o acontecimento.
E depois com tantas siglas e bandeiras, discursos e palavras de ordem, estava completamente baralhado.

Deveria optar pela continuidade e votar PS?
Ou escolher a alternância e optar pelo PSD ?
Seria melhor romper com os tradicionais e dar o seu contributo para o crescimento do Bloco de Esquerda?
Optar por uma Esquerda mais clássica, ou seja, pelo PCP, melhor dizendo, pela CDU ?
Ou rodar para a direita, para o PP/CDS, tantas vezes dado como morto, mas, sempre, renascido das cinzas ?
E depois havia toda uma constelação de pequenos Partidos, com cartazes com caras conhecidas, mas dos quais desconhecia a ideologia e programa.
Que fazer? Em quem votar ?
Também podia votar em branco ? Ou entregar um voto nulo...
Mas essas soluções, não lhe agradavam tanto.

Finalmente, chegou o Domingo das eleições.
Procurou o BI e o Boletim de Voto.
Pôs gel para baixar a crista de que tanto se orgulhava.
Mas a cerimónia exigia algum recato...
Depois de muitas hesitações, escolheu um fato de treino branco, da Adidas.
Encheu-se de água de colónia, que comprara numa viagem a Badajoz.
Pôs os óculos escuros, tipo Armani.
E lá foi ele.

O local de voto, uma Escola C+S, ficava a três quarteirões da sua casa.
Quase não havia filas para votar.
Na sua cabeça giravam as siglas CDU e BE, PSD e PP, PS ou MMS...
A cara da Laurinda Alves misturava-se com a do Paulo Rangel, o Miguel Portas aparecia com o bigode do Vital Moreira e o galã Nuno Melo travestido de Ilda Figueiredo.
Uma confusão, sentiu uma tontura crescente.
Mal ouviu repetirem o seu nome e número de Eleitor.

Sem se aperceber, estava na cabine de voto, com um boletim numa mão e a caneta na outra.
Não conseguia focar, nem ler uma só palavra.
O suor caía-lhe em bagas frias, pela testa abaixo.
O tremor das mãos espalhou-se pelo resto do corpo.
Sentia o sangue a esvair-se ...Uma sensação de enjoo e vómito.
A custo, conseguiu rabiscar um X no boletim de voto.
Depois, caiu redondo no chão.
Mas com a sensação do dever cumprido.
Só acordou no hospital, ligado ao oxigénio e alimentado a soro.

Entretanto, alguém apanhara o boletim deixado no chão.
Um grande X preenchia...as costas do impresso !
O Voto foi considerado, nulo.

Morcela Vitorino

9 comentários:

  1. Embora, como é óbvio, este texto não passe duma sátira, oportuna e bem conseguida, a verdade é que são este tipo de eleitores, hesitantes e mal informados que distorcem a verdade das eleições e aumentam a percentagem de partidos que estão mais na moda, têm muito mais cobertura televisiva ( já viram quantos jornalistas perguntaram a um líder de um destes partidos se já tinha falado com o irmão, líder de um partido de sinal contrário?Qual seria o interesse de tal pergunta, repetida à exaustão? )ou têm mais figuras de charme e mediáticas.
    Quanto a políticas e soluções, zero...

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  2. Então MTH, agora até para criticar um Conto aproveita para fazer um comício?
    Talvez seja por isso que os jornalistas prefiram entrevistar um Miguel Portas ou uma Ana Drago a escutarem a cassete do Jerónimo de Sousa e de tantos outros dos seus camaradas , seus dele, entenda-se.

    Quanto ao Conto, ganha principalmente pelo sentido de oportunidade.
    Ainda deve estar quentinho, saído do forno.

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  3. Eu votei no Partido em que, desde sempre, se votou lá em casa, e também, confesso, porque o cabeça de lista era o com mais classe de todos mas, reconheço, não me lembro de uma única medida sugerida para a Europa.
    Também para quê? Depois lá não temos força nenhuma.

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  4. Adorei o pseudónimo do(a) contista!

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  5. Conto oportuno e curioso pois retrata um inesperado personagem.
    Provocou e vai provocar comentários para todos os gostos.

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  6. Como o voto é secreto, só posso dizer que o meu Partido ganhou as Eleições !!!
    ...Mas como todos dizem que ganharam!
    Quanto ao conto, da descrição á assinatura nota 20.

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  7. Não entendo nada do que o cara fala, tem um sotaque esquisito mas o único gato é do tal PP.

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  8. Margarida Ferreira dos Santos8 de junho de 2009 às 11:50

    Concordo com a Quimera, é um excelente pseudónimo! Fez-me lembrar os dois comentadores de ontem na RTP, o Marcelo e o Vitorino. Tudo a ver com o conto...será que foi essa a ideia do autor(a):-)

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  9. Micro conto excelente e oportuno. Votei no do costume, mas de ideias para a europa...não me recordo de ter ouvido de nenhum dos partidos. Umas campanhas europeias muto viradas para o umbigo cá do burgo.

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