Uma arreliadora avaria informática na crónica que tinha escrito deitou o ficheiro a perder. Ficheiro irrecuperável. Foi tudo para o lixo, na impossibilidade de o abrir. Com ele, foi também a minha paciência e até o tema que abordara. Porque aconteceu, como e quando, são para mim mistérios: eu sou apenas um mero utilizador. Assim, e já “para lá do prazo”, vejo-me na contingência de ter de voltar a alinhavar uma meia dúzia de linhas para que esta semana, a pena continue a correr. Não sei se os leitores do Blog dariam por ela, mas eu daria com certeza: este vício de escrever, como diria Fernando Pessoa, “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”. Já agora, e segundo li, Fernando Pessoa inventou esta frase quando, tal como tantos outros escritores portugueses enveredou pelo mundo da publicidade. Ele terá sido só o primeiro (e provavelmente o maior) dos nomes grandes da literatura portuguesa que por aí tentaram buscar sustento, que o país iletrado que éramos (e funcionalmente ainda somos) não permitia a quem dependia da caneta (esferográfica, lápis, máquina de escrever e, mais modernamente, computador) de sequer levar uma vida digna. José Carlos Ary dos Santos e Alexandre O’Neill são só outros dois.
Mas, voltando à frase de Fernando Pessoa, devo dizer que, por ignorância, não sabia que a frase era dele, e ainda menos, qual a sua génese, a sua origem. Pois o Fernando Pessoa ele próprio (que nisto de Fernando Pessoa, há que ter cuidado de quem se fala) tentou inventar uma frase que apelasse ao aumento do consumo de… Coca-Cola em Portugal! Imagine-se, a grande bebida americana, na altura, em expansão, socorreu-se da imaginação de Pessoa para a sua expansão no mercado português. Corria o ano de 1928 e a frase é sem dúvida de grande qualidade. A bebida já se vendia bem, mas sabemos quanto a Coca-Cola aprecia e promove a sua própria publicidade. No entanto, como é sabido, a sua venda durou pouco: a Direcção Geral de Saúde decidiu proibir a nova bebida, argumentando que seria tóxica. Para isso, apoiou-se até na frase de Pessoa, argumentando que o slogan é ele próprio o reconhecimento da sua toxidade… Já era Salazar que por aí andava, novinho em folha e enganando alguns, entre os quais o próprio Pessoa, que inicialmente apoiou a ditadura. Mas o apoio de Pessoa foi muito efémero: os princípios salazaristas não se coadunavam com a sua maneira de ser nem com os seus princípios.
Não surpreende portanto que o mesmo Pessoa, passado algum tempo escrevesse sobre Salazar:
António de Oliveira Salazar
Três nomes em sequência regular...
António é António
Oliveira é uma árvore.
Salazar é só apelido.
Até aí está tudo bem.
O que não faz sentido
É o sentido que isso tudo tem.
E como ele tinha razão!
Fernando Pinto
sábado, 6 de fevereiro de 2010
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Oh Fernando, no nosso tempo de putos já não havia aqui Coca-Cola, aliás nem Pepsi (o Salazar ter-se à zangado com os gaijos eles todos ? essa nunca entendi... ou terá sido porque o Kennedy resolveu não apoiar completamente cá as merdas dele ?)
ResponderExcluirSe bem te lembras o que havia ao dispôr era Canada Dry.
'Ganda prosa man !
:-)
Notinha de rodapé:
O Pessoa quando se metia em política básicamente asneava, acho eu...
Se a memória não me falha [já há muitos anos que me contaram isto...] o problema não seria a toxicidade da bebida, - mas o seu prefixo!
ResponderExcluirPois a ser verdade, a COCA do nome da marca sugeriu que se tratasse de um subproduto da Cocaína - e não está muito longe disso, já que no início do século passado era produzida à base da Planta da Coca, tendo sido mais tarde substituída por noz-de-coca, já sem réstea de cocaína, portanto. Mas inicialmente não só continha realmente extracto de cocaína, como era considerada um medicamento.
E Salazar talvez tenha visto nisso um verdadeiro perigo para a saúde pública [apesar da décalage de 20 anos entre a Coca-Cola remédio e a Coca-Cola refrigerante exportado para todo o mundo, incluindo Portugal].
Reza a história, também, que o último carregamento desse infame líquido, antes da sua proibição por mais de 40 anos, jaz no fundo do Mar da Palha, descarregado directamente do cargueiro que o trazia.
Mas, convenhamos, quando o assunto mete Pessoa, há muita enfabulação...
De ser o autor das "pedras no caminho" [que já foi aqui desmentido], ao seu corpo, à data da trasladação, não estar minimamente decomposto sugerindo a sua santidade, a esta historieta 'coca-colar', muito haveria que dissecar até se chegar ao osso...
De facto, a história da proibição da CocaCola parece ter algum fundo de verdade quer no que respeita a Salazar quer em relação a Pessoa.
ResponderExcluirDo primeiro muitos falam com pouco saber mas pelo menos nunca colocou o País na situação em que agora estamos e naquela que já em tempos cá colocou o FMI.
Do segundo muitos sabem mas pouco falam, embora não se lhe negue uma criatividade invejável.
Agora que a CocaCola é uma bebida de que muito gosto e mundiamente apreciada, isso todos sabemos e falamos !
A referida bebida parece que tem umas propriedades médicas inexcedíveis.
ResponderExcluirEssa minha amiga que é médica contou que apareceu lá no hospital um puto que tinha qualquer porcaria que tinha resolvido tentar engolir no meio da garganta.
'Tava toda a gente à rasca, sem saber o que fazer, quando a Ana M.R. se lembrou desta: mandou alguém comprar uma Coca-Cola, pôs isso num drip na garganta do puto, e ao fim de um tempinho a bebidinha tinha dissolvido lá o que ele tinha tentado engolir.
Naice ! Boa bola, Coca !!
:-)
Fernando...
ResponderExcluirO Lobo Antunes queixou-se, uma vez, de que o computador lhe tinha engolido um romance inteiro...
Não gosto de Coca-cola, mas gosto de ver esta tua pena a correr!
Oh Moira, então será por isso que os golfinhos deixaram de frequentar o rio Tejo, aquilo estará lá tudo dirty muito em baixo com "a água suja do imperialismo" ?
ResponderExcluirOu serão os excelentes (e radioactivos...) efluentes dessa espantosa instituição LFEN (Laboratório de Física e Energia Nuclear) se por acaso ainda se der ao trabalho de existir ?
:-(