terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

"Oh, como é diferente o Humor em Portugal..."

Era uma vez, no tempo em que os Animais falavam, mas ainda não ocupavam lugares públicos, um Filho único tristonho e melancólico que passava os dias, antes de saber ler, a desenhar legiões romanas que depois recortava e com as quais organizava batalhas homéricas, dignas de um qualquer Quo Vadis.
Lembro-me que por essa altura, teria eu quatro/cinco anos, os únicos momentos bem dispostos chegavam-me através das ondas hertzianas do Siera colocado na cozinha ( ...a Publicidade aliás dizia "Schiu, está um Siera a tocar!!!").
Ainda ouvi, mas mal me lembro, um programa chamado "Lélé e Zequinha"com o Vasco Santana, mas o que era sagrado todos os Domingos à hora do almoço, e eu nunca perdia, era a "A Vida é assim", diálogos de José de Oliveira Cosme em que no meio de uma conversa familiar iam sendo metidas umas buchas com anúncios como o célebre"Candeeiros bem bonitos, modernos, originais..." e por aí fora.
Algum tempo depois apareceram os "Parodiantes de Lisboa", debaixo da direcção dos manos Andrade, e Rui, e que no seu período áureo, que durou décadas, tinham muitas horas de emissão diária, ridicularizando as telenovelas e criando personagens inesquecíveis como os célebres detectives Patilhas e Ventoinha, introduzindo expressões como as da Flausina e do Báu Báu e editando até uma revista de cartoons por onde passaram excelentes desenhadores como o João Martins, a que um dia destes dedicarei um post, o Zé Manel, o Túlio Coelho,entre muitos outros.
Era um Humor popular, um pouco pesado, mas que tinha muitos admiradores.
Na equipa extensa dos Parodiantes, com estúdios no prédio do Vává, havia também lugar para locutores "sérios" como foi o caso do Carlos Cruz, do Victor Espadinha ou do Fernando Quinas.








Entretando no Cinema, brilhava
a dupla Vasco Santana/António Silva
criando frases que, até hoje, perduram na nossa memória
- "Ó Evaristo tens cá disto?"
é, sem dúvida, mais célebre de todas.

Ao mesmo tempo, no Teatro de Revista eram inúmeros os cómicos, geralmente masculinos, como o Eugénio Salvador, o Costinha,
o Humberto Madeira, o José Viana
ou o Henrique Santana, filho do outro Santana.
Nas mulheres destacavam-se a Florbela Queiroz,
a Ivone Silva, e pouco mais.





Mas, na realidade, o primeiro Cómico
digno desse nome que eu ouvi e,
mais tarde, vi em Espectáculos
e na Televisão, foi o Raúl Solnado.
De figura franzina e com uma gaguez cativante, Solnado
com a sua História da Guerra fez chorar de tanto rir
toda uma Geração."Está laáa?...É da Guerra?"
e depois" ...cheguei à Guerra, a Guerra estava fechada",
ou " ...amarra-se a bala com uma guita"
foram os momentos de puro non sense mais antigos da minha Vida.
Felizmente não seriam os últimos...


A seguir passei vários anos
fora de Portugal.
Primeiro em África,
também na Guerra mas a sério e, depois de uma breve estadia por estas bandas, mais três anos
no Brasil e nos Estados Unidos.
Tive então possibilidade de contactar ao vivo com
o Jô Soares, o Chico Anísio, o Agildo Ribeiro
ou o Steve Martin, que, com excepção do primeiro, não me deixaram grande recordação.
De regresso à Terrinha, apanhei com o sucesso Senhor Feliz, Senhor Contente em que a dupla Nicolau Breyner e Herman José, um já experiente nestas andanças e o outro a dar os primeiros passos naquela que viria a ser a carreira mais extensa e produtiva dum humorista português. Independentemente de ter tido muitos momentos altos e outros, bem, menos felizes...



Realmente alguns dos bonecos do Herman nos seus primórdios como o Tony Silva ( "Foi Rôbado" ) com as louras Helena Isabel e Natália de Souza, a fazerem de partenaires, a Filipa Vá Com Deus, a Jákiná, Jákiná, o Estebes, o Serafim Saudade, o Nélinho, o Sr.Engenhêiro, ou mais recentemente, o Diácono Remèdios ou o Nelo, gay não assumido, são momentos únicos no nosso panorama humorístico.

Também no aspecto da equipa
que foi construindo e mantendo
( Ana Bola, Victor de Souza,
Maria Rueff, Maria Vieira,
Joaquim Monchique, entre outros)
o papel de Herman foi muito positivo.
A desgraça só chegava quando se metia a fazer talk shows, na linha de um Jô Soares, sem ter a mínima bagagem cultural em que o Mestre inspirador é exímio.

Agora, de novo nos Concursos
parece que recuperou o carinho do público
que, nos últimos tempos,
o deixara de seguir.

Os dois elementos mais criativos da sua ex-equipa, Maria Rueff e Ana Bola
iniciaram depois uma carreira a solo com momentos de inesgotável bom humor.
A Denise e a Maria Delfina, mais o corner de nails, vão ficar como um dos momentos altos, primeiro na Rádio e depois na Televisão, do Humor nos primeiros anos deste século.

O estilo stand up comedy, com vários artistas a fazerem espectáculos em conjunto, como é bom exemplo o Levanta-te e Ri, serviriam para criar agrupamentos de humoristas contrariando a ideia do cómico solista, como o Solnado, o Nicolau ou o Herman, para falar só dos exemplos mais óbvios.

A grande pedrada no charco surgiria com os Gato Fedorento em que quatro jovens de talentos vários
( sendo Ricardo Araújo Pereira o Sol ,
Zé Diogo Quintela um Planeta secundário
e Miguel Góis e Tiago Dores,
uns meros Meteoritos).
puseram Pais e Filhos a rirem das mesmas graças, a contarem pormenores dos sketches, ou a repetirem as frases mais emblemáticas.
Infelizmente, o sucesso extraordinário, os aplausos unânimes, as solicitações para anuncios, crónicas, etc parecem ter esgotado a criatividade, irreverência e necessária agressividade que no último trabalho do grupo, apresentado na SIC, esteve manifestamente ausente.
Esperemos que tenha sido apenas uma fase menos boa e que
o talento de RAP os consiga fazer dar a volta por cima.







O sucesso, quase imediato, dos Gato Fedorento associado à experiência do Levanta-te e Ri, mais a extinção da equipa Herman, criaram as condições para o aparecimento de Os Contemporâneos onde Bruno Nogueira, Eduardo Madeira, Nuno Lopes, Nuno Markl, Gonçalo Waddington, Carla vasconcelos e Dinarte Branco, recuperaram a loucura, non sense e anarquia, essenciais, no meu entender, ao Humor, e têm conseguido alguns momentos altos que nos fazem rir ...e pensar.
Nesta breve, e necessariamente incompleta, resenha do Humor em Portugal ( ...daquele que eu me lembro e mais me marcou! ) terminamos com uma experiência que não sei bem se terá cabimento por estes lados, já que o CQC, Caia Quem Caia, é um formato importado, um franchising de Humor que já existe em outros países, embora com intervenientes nacionais.
Neste programa vários pretensos jornalistas, de fato e gravata pretos e óculos escuros, entrevistam com o ar mais sério deste mundo, políticos, figuras públicas e reis do show bizz, criando situações insólitas e muito bem dispostas.
E pronto, feito apenas na base da memória e sem qualquer trabalho de pesquisa ( salvo para os nomes dos Contemporâneos), este breve historial estará repleto, com toda a certeza, de imensas lacunas e erros eventuais. Ajude-nos com os seus comentários, lembranças e reparos.


E lembre-se...Rir é o Melhor Remédio!!!



5 comentários:

  1. Apesar da boa memória não ser o meu forte, creio que está cá tudo e os "clips" seleccionados para este "post" ilustram, na perfeição, o humor do antes e do agora, no nosso país.
    E também relacionado com o que de muito bom se fez, com Humor, em Televisão, em Porugal, nos tempos idos do Canal Único, não posso deixar de recordar o "Zip Zip", apresentado por três dos maiores comunicadores daquela geração - os já referidos Carlos Cruz e Raúl Solnado e, ainda, Fialho Gouveia.
    Pioneiro, em finais dos anos sessenta - o momento único de ver Almada Negreiros ao vivo e a preto e branco..., foi o programa de televisão inovador, que deu mote a muitos daqueles que se lhe haviam de seguir.

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  2. Pois é Contessa, o Zip Zip ( primeiro como Programa de Televisão e depois como Programa de Rádio, e por coincidência produzido pelos Parodiantes de Lisboa) mereceria um post alargado aqui no"Galo" mas o que se passa é que não consigo obter quase nada como suporte gráfico - fotos péssimas e muito pequenas. Mas como desistir não é próprio de um galináceo que se preza, continuaremos na procura.
    ...A busca continua !!!

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  3. Faltou só a referência ao programa da Maria Rueff como protagonista,e já com alguns dos elementos dos actuais Contemporâneos, que foi completamente destruido pelas continuas mudanças de horário e talvez pelo seu humor vanguardista mas que foi das melhores coisas feitas em televisão.Chegou a ver algum?

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  4. Esse programa( como é que se chamava? "A hora de Maria"?) era realmente sensacional,com imenso experimentalismo(cenas a passarem de P/B para cores,freezers, etc)mas todo esse modernismo somado à já mencionada dança do horário fez com que fosse um nado morto,na práctica.

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  5. Só a partir do Herman é que eu acompanhei,mas gostei das outras informações mais antigas. A História da Guerra do Solnado é de ir às lágrimas.

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