quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

(Sobre)Viver

A Vida é curta. Demasiado curta.
Quando nos apercebemos da razão
de andarmos por cá.
Já estamos no final da mesma.

Serão mais felizes as pessoas sem projectos.
Que se deixam envolver
pela neblina rotineira do quotidiano
pelo ronronar satisfeito
da missão cumprida (comprida?).
Pelas casas, carros, netos, filhos
contas bancárias, diplomas
e honras várias.
Pelos charutos e whiskyes velhos.
Pelas peles e pelas pérolas.
Pelos livros encadernados na estante.
Pelos quadros pendurados na parede.

Eu quero fazer tudo.
Tenho ainda tudo para (por) fazer.
Olho para trás, num relance,
e vejo que pouco andei até aqui.
Quero erguer-me, ganhar asas e voar.
Sobrevoar os Andes, planar na Amazónia,
refrescar-me no Nilo,
picar em flecha os arrozais de Chiang Mai,
descansar num embondeiro moçambicano.

Ainda tenho que ler milhares de livros,
ver milhares de filmes,
ouvir milhares de músicas,
percorrer milhares de estradas.

Sinto agora a puberdade, borbulhento,
contestatário, irreverente.
Quero experimentar o sofrimento,
sofrer e experimentar de novo.
Quero sonhar sonhos impossíveis
e torná-los possíveis...
Quero viver cem vidas diferentes,
ser homem, mulher, gato, cão
e onda do mar.
Quero mergulhar nos abismos,
subir os picos de neve,
entrar em vulcões extintos
e tornar a lava, fumegante outra vez.
Quero jogar com as palavras e as cores,
os aromas, os sabores.
fazer da noite, dia, das manhãs um pôr-do-sol
e da lua, madrugada.

Quero ter tempo para mudar o mundo
criar outro sistema solar,
atravessar o universo, ver o cosmos do avesso.
Trocar Deus pelo Diabo, rodar o Norte para o Sul
Juntar o Amor com o Ódio, unir a Dor ao Prazer.
Quero sentir tudo e tudo poder escolher.
Quero escolher viver.
Outra e outra vez.
Nascer e renascer.
Ter tempo.
E quando por fim saciado
tiver concluído todos os desejos
sonhos e delírios.

Começar tudo, outra vez.

8 comentários:

  1. Achei o poema magnífico.Quem é o poeta?

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  2. Obrigado Pedro. Todos os textos não assinados são do autor do blog.

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  3. "É sempre o amanhã.
    A inexorável marcha do tempo".

    Paul Auster in "Smoke"

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  4. A Contessa levou o Paul Auster para Cabo Verde?
    Leia o último. É estranho mas de tão embrenhada que estou, nem me consigo lembrar do título: "O homem...". Só me lembro de encarcerado mas sei que não é. Anyway, é fantástico, uma história dentro da história.
    E João, encontro algumas semelhanças com o seu poema."Ver o cosmos do avesso", "mergulhar no abismo", "experimentar o sofrimento"...
    Quimera

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  5. Auster ~ "Leviathan" ou a trilogia de n.y., for the road or read some other author if you please...just my 2 cents.
    n., beijinhos.
    johnny, excelente e oportuno o teu poema.

    byes;

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  6. Quimera
    O último do Paul Auster é o "Homem na Escuridão".
    Quanto ao"poema" não era poema nenhum, foram só pensamentos escritos ao correr da pena, mas vocês começaram a chamar-lhe poema e eu,que tenho bom feitio(Ah!Ah!Ah!,não disse nada...

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  7. pensamentos assim também eu queria ter...

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  8. Poema ou não,é lindissimo.

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