parece-me um exercício egoísta:
“projectei assim porque sou capaz!”
é o que me diz toda a peça arquitectónica,
à medida que percorro
os seus insondáveis caminhos.
Mas se calhar sou eu que estou a ouvir mal…
Muito já se escreveu sobre o tema: as derrapagens orçamentais, os prazos largamente excedidos, entre outros temas quentes.
Não sei se aqui no Galo o assunto já foi debatido. Além da preguiça avassaladora em pesquisar no histórico de posts, achei que, se encontrasse algo provavelmente isso iria demover-me deste e por isso, nem procurei. Bendita ignorância, uns dirão; “Por que no te callas?”, dirão outros.
E assim me atrevo:
A minha visita a este espaço cultural deixou-me com a boca a saber a papel de música – passe o pleonasmo.
Querem acreditar que não consigo ter uma opinião formada quanto à estética do edifício?
Qualquer miúdo de 6 anos sabe se gosta ou não; eu não sei.
Esta súbita ignorância que me brindou enquanto ainda desenhava adveio disso mesmo: o facto de se estar a desenhar algo “à vista” força-nos a que estejamos sempre a questionar as opções tomadas no desenho. Passo a explicar: esta linha está com a mesma inclinação daquela? Até onde vai esta curva? O tecto está direito? As linhas de perspectiva das juntas da pedra estão convergentes para o horizonte?
Acontece que, por razões óbvias, neste local os arquétipos são, na sua génese, díspares, isto é, não há muitas concordâncias de espaço. A inclinação do tecto não corresponde à do chão; as juntas da pedra são propositadamente oblíquas; os corredores são declives, as janelas trapézios.
Perante isto – e para se continuar no rigor pelo desenho – começa-se a “copiar por cima”. Parece batota mas não é. Trata-se de olhar para o objecto e desenhá-lo como se de um produto abstracto se tratasse. Esqueçamos que aquilo é um tecto e isto é uma janela; desenhemos, pois, rectângulos, trapézios e todos os polígonos que vemos como isso mesmo – apenas polígonos.
Confusos? Imaginem, então, que não falam uma palavra de sueco. Se precisarmos de aprender rapidamente a dizer “olá” não vamos aos livros; ouvimos o vocábulo nativo e tentamos reproduzir o som. Por vezes até inventamos uma grafia – mesmo que mental - que corresponda a esse som, para que saibamos repeti-lo. Pois bem, essa grafia é este tipo de desenho – “o copiar por cima”, desligando-se da matriz real e dando-lhe outro[s] significado[s].
Já repararam, certamente, que muitas vezes me incluo no desenho que faço. Este é o caso em que, ao inserir-me no contexto, contribuo para acrescentar alguma ‘realidade’ ao objecto desenhado. E um ponto de referência, também.
Nestes precisos desenhos eu necessitei mesmo de me incluir neles pois estava de tal forma abstraída na cópia do emaranhado de formas que facilmente me distanciei do desenho
Perante isto – e para se continuar no rigor pelo desenho – começa-se a “copiar por cima”. Parece batota mas não é. Trata-se de olhar para o objecto e desenhá-lo como se de um produto abstracto se tratasse. Esqueçamos que aquilo é um tecto e isto é uma janela; desenhemos, pois, rectângulos, trapézios e todos os polígonos que vemos como isso mesmo – apenas polígonos.
Confusos? Imaginem, então, que não falam uma palavra de sueco. Se precisarmos de aprender rapidamente a dizer “olá” não vamos aos livros; ouvimos o vocábulo nativo e tentamos reproduzir o som. Por vezes até inventamos uma grafia – mesmo que mental - que corresponda a esse som, para que saibamos repeti-lo. Pois bem, essa grafia é este tipo de desenho – “o copiar por cima”, desligando-se da matriz real e dando-lhe outro[s] significado[s].
Já repararam, certamente, que muitas vezes me incluo no desenho que faço. Este é o caso em que, ao inserir-me no contexto, contribuo para acrescentar alguma ‘realidade’ ao objecto desenhado. E um ponto de referência, também.
Nestes precisos desenhos eu necessitei mesmo de me incluir neles pois estava de tal forma abstraída na cópia do emaranhado de formas que facilmente me distanciei do desenho
– e quase me perdi.
E foi isso que também me aconteceu lá, na Casa da Música, ao percorrer todo aquele emaranhado de espaços – perdi-me. Não exactamente no sentido geográfico mas mais precisamente no sentido da assimilação e compreensão da arquitectura. A abstracção foi para mim, demais; distanciei-me do propósito do edifício; ausentei-me da sua lógica e perdi-me.
Não há dinheiro para escolas nem para hospitais, mas para elefantes brancos como este , há sempre.
ResponderExcluirDesta vez o dinheiro não foi para estádios ou auto estradas desnecessárias mas para um Palácio da Música, só para alguns e segundo tenho ouvido com uma programação de fugir.
Mazs são estes os governos que temos tido, e pelos vistos, iremos continuar a ter.
Nós na música o que gostamos mais é de...soprar no pífaro.
ResponderExcluirOra aqui está um interessante tema para as nossas divagações.
ResponderExcluirEstive lá e não gostei da arquitectura exterior e muito menos da localização. Subjectivismos à parte, a cultura bem merece todos os espaços possiveis e pelo que sei, a má disposição critica de MTH não parece justa, excepção quanto aos estádios !!
Belos desenhos. Que inveja não ter o saber e a arte da Moira !
Olhe Moira, bela aula de arquitectura. Se tivesse acompanhado com uma musiquinha teria sido excelente.
ResponderExcluirEu que nunca lá entrei, gosto do volume da coisa quando visto por fora. Mas tenho a certeza que se lá for, vou olhar com olhos de Moira. Depois lhe direi.
Gostar ou não gostar da arquitectura até não será o mais importante, só pelo gosto pessoal.
ResponderExcluirA estação do Calatrava, lindissima, será uma estação funcional e eficaz?A pala do Siza para além do arrojo do traço terá algum sentido?Toda a obra do Siza, aliás, é para Revistas, Prémios e Arquitectos ou para pessoas, como nós?As casas são para serem vividas? Tenho sérias dúvidas.
Mas voltando ao gostar, todos diziam mal das Amoreiras e agora já aceitam que até, para Centro Comercial, não está mal.
Houve quase um levantamento em relação ao CCB e à sua localização e agora, as mesmas pessoas, já o apreciam.
Os arquitectos estão sempre avançados em relação à sua época, como todos os outros artistas, aliás.
Agora, quando não se investe na Cultura dizer mal e quando se investe dizer mal, na mesma, parece-me um pouco exagerado...
E a propósito deste post magnífico (mais um) da Moira de Trabalho, que aproveito para publicamente reconhecer a minha admiração por aquilo que escreve e desenha, ocorreram-me um sem número de lembranças sobre essa cidade que um dia me acolheu.
ResponderExcluirEstudei no Porto. Vivi lá durante cinco inesquecíveis anos. A cidade já a conhecia e já me tinha cativado em visitas anteriores. Aquele cinzento dos edifícios. A chuva interminável. Há quem não aprecie. Eu adoro aquela atmosfera permanentemente melancólica. Que depois nos faz viver intensamente os dias luminosos de Verão, nas esplanadas da Ribeira, o Douro em frente. A saborearmos o fino, em conversas com sotaque.
Quando voltei para a terra natal, o canudo numa mão, o desemprego na outra, já se ouviam zunzuns da Capital Europeia da Cultura.
Voltei lá amiúde para matar saudades. Fui assistindo a uma cidade esburacada. As estátuas desaparecidas das praças. O pouco verde que existia no cizento a desaparecer. E a Casa da Música. As incontáveis polémicas. O caos na zona enquanto duraram as obras. Se bem me lembro, a Cultura veio e foi e a Casa da Música não ficou pronta.
A última vez que estive no Porto, há dois anos, pude finalmente observar o resultado. Os novos Aliados e a Praça da Liberdade. Mais arrumadas, mas menos verdes. A zona ribeirinha, morta. Disseram-me que os finos e as conversas com sotaque agora acontecem do outro lado do rio, em Gaia. Tive pena.
As estátuas estavam novamente no seu lugar. A cidade mais limpa. Mas menos vivida. E não sei o porquê desta associação... Andei de metro. Um preço astronómico para andar meia dúzia de metros que sempre gostei de fazer a pé.
E visitei a Casa da Música. Quando olhei para ela, senti o mesmo que a Moira sentiu, embora por razões diferentes. Não sei se gostei ou não. Senti-me desiludida. Tanto esforço. Uma cidade despedaçada durante tantos anos (porque foram anos!) traduzida naquele edifício. Senti que era pouco para o sacrifício...
Mas um dia, quem sabe? Lembro-me da polémica que foi o Centro Cultural de Belém e hoje não consigo imaginar Lisboa sem aquele edifício. (Polémicas orçamentais à parte!) Ele há coisas...
Um Olé com Duende! para a Moira. Obrigada por este momento de memórias...
E bibó puarto, carago! ;)
Esse edifício é um pesadelo horroroso, restos de um projecto para centro comercial ou lá o que o valha, que o Rem tinha esquecido numa gaveta qualquer... :-P
ResponderExcluirÉ um deleite "ouvir" as palavras escritas pela Moira e o sublinhado do seu traço! Uma verdadeira aula partilhada, onde quem quer intervem!E as analogias que ela arranja!!!!
ResponderExcluirO seu comentário Payita fez-me saudades do meu "Porto sentido". Que delicadeza e sensibilidade!
Ah, ia-me esquecendo... eu também vivi quase 5 aninhos no Porto --- a cidade é linda, o povo não presta de uma maneira geral, estão cheios de complexos e "hidden agendas" --- e não deixo por isso de me reconhecer como "sulista, elitista e liberal"... :-P (já agora, o gaju que inventou esse palavrório tem casa em Nevogilde, e para Porto mais elitista que isso não há..) :-P :-P
ResponderExcluirSerralves, de todo em todo, em todo...!!!
P.S.
Mosquiteiros, boas assopradelas... :-D
Pois eu gosto. Da Casa Música, diga-se. Do trabalho da Moira nem vale a pena dizer, é sempre genial. Deve ser bom ser-se artista... Voltando à Casa da Música: gosto... ia tentar explicar porquê, mas não consigo. Gosto e pronto, por fora e sobretudo por dentro. Agora se vale o que custou em dinheiro e em sacrífico da cidade é que já não sei.
ResponderExcluirP.S. - Mesmo habituada, continuo a achar as Amoreiras um horror.
O que não impede:
ResponderExcluirMoira, os teus desenhos são muitíssimo bons. :-)
Estou embevecida...
ResponderExcluirGratíssima a todos pelo apreço que demonstram pelos desenhos que faço.
Modéstia seria inglória aos comentários de todos.
Só posso acrescentar que o faço com um enormíssimo prazer e que os mostro na procura da partilha da emoção que me dá fazê-los.
Quanto ao "jeito": tenho tanto como aquele que canta no duche, já que só escuta quem está no quarto ao lado.
E todos vós, aqui no Galo, estão no "quarto ao lado" do meu caderno de desenhos.
Obrigada, a todos.
Por fim:
Zé Manel, a inveja é o mais delicioso dos pecados: faz-nos sentir o prazer dos outros!
LaPayita, deu-me imenso prazer lê-la. Continue, por favor;
Quimera, a música pode ser Air, em Ce Matin La. E quando for lá, leve um iPod!;
para Pronúncia do Norte, ouça-se Rui Veloso jazzístico e tudo volta a ser como era;
MCM, o gosto é tudo. Nas universidades ensina-se que o gosto não pode ser um elemento de discussão. Não podia estar mais em desacordo. Continue a gostar e a detestar o que lhe der na bolha! (PS- eu também horrorizo com as Amoreiras e quanto mais tempo passa, pior ainda!);
e, finalmente, Alvega, muito bom é estar aqui nesta partilha. Obrigada.
Lindo texto...traços em consonância. Obrigada "Moira" pelo prazer que nos vai dando com os seus "Trabalhos".
ResponderExcluirobrigado pelo texto e pelas imagens.
ResponderExcluirnão sei - não tenho o saber para - se são bons ou não. apenas gostei e aprendi...
este post devería ter a data de hoje:
dia Da paixão
http://www.youtube.com/watch?v=6HUENj1-rTw
Mais uma excelente DesenhoReportagem da Moira.
ResponderExcluirSó conheço o edifício por fora, mas também não gosto.Agora fiquei com vontade de o ver por dentro. Fica para a semana, quando voltar à Invicta.
Vou no Porto pra semana. Não quero deixar de visitar essa tal de casa da música.
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