Ainda hoje não tenho a certeza se me viste e conscientemente desenvolveste aquele jogo, ou, se pura e simplesmente te deliciavas a comer um gelado
Ainda hoje te vejo bela, sensual, numa entrega ao prazer dos sentidos.
Na mão o cone de bolacha encimado por uma bola vermelha de gelado de framboesa.
E a tua língua, rosada, a surgir atrevida por entre os teus dentes brancos que mordiscavam a bola vermelha de gelado de framboesa E depois passavas a língua, melhor dizendo a ponta da língua pela esfericidade da bola de gelado de framboesa e dessa passagem resultava um sulco, um sulco quase só aflorado, um sulco que parecia não existir existindo e a tua língua, agora mais afoita avançava sobre a bola vermelha de gelado de framboesa e voltava a torna-la mais bola, mais esférica, mais perfeita.
E depois abocanhaste o gelado os teus lábios fizeram-se como que ventosa e a bola de gelado desapareceu na tua boca para logo de imediato voltar a surgir como que pedindo que a voltasses a esconder nessa gruta sensual onde a tua língua dominava.
Quando os teus dentes mordiscaram sensuais a bolacha quebradiça do cone pareceu-me que o mundo parara, pareceu-me que todos os homens te olhavam, que todos os homens te desejavam como eu te desejava naquele instante.
E tu continuaste o teu jogo de sensualidade, de prazer, do teu prazer, da tua vontade de satisfazeres desejos, de uma capacidade de provocação de que, hoje, estou certo, tinhas perfeita consciência.
O que agora me parece mais interessante, era essa tua capacidade sensual de te satisfazeres de dois modos.
Num, imediato, perfeitamente centrado nos sentidos, no gosto no tacto, quando comias o gelado e um segundo, mais intelectual, ainda que todo ele também centrado numa sensualidade quase primária de algo vivido e sentido naquele próprio instante, mas ao mesmo tempo projectado para fora de ti como que uma teia de aranha que invisível ao insecto desprevenido se estende e ali fica reflectindo por vezes réstias de luz, partículas de chuva que a tornam mais perigosa, mas simultaneamente sedutora de uma sedução assassina da qual não há fuga a não ser para a frente, que é como quem diz para a morte.
E foi aquilo que me aconteceu.
Apaixonei-me por ti...E o que é engraçado é que fui correspondido.
Quando acabaste de sensualizar com o gelado olhaste-me, sorriste-me e foi como se sempre nos tivéssemos conhecido.
Contos do Feeling Estranho
domingo, 12 de abril de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
O Feeling Estranho afinal não tem só "feelings estranhos", também tem dos normais.
ResponderExcluirBem escrito, erótico na quantidade certa, romântico ao mesmo tempo. Uma linha a desenvolver, na minha opinião.
Assim é que começam casos que depois dão para o perigoso. A tentação das Lolitas...
ResponderExcluirBom conto.
O Complexo da Eva e da maçã transporto para os nossos dias. A Mulher é sempre a Tentação, o Pecado e o homem, coitadinho, lá cai na armadilha. Que pena que eu tenho dos homens.
ResponderExcluirÔi Estranho, gostava de me ver comendo um picolé? Quem derretia era você...
ResponderExcluir