Quem tenha lido alguns dos livros de Jorge Amado, certamente imaginou como seria a vida no interior do Estado da Baía e o seu mundo, dominado pelos velhos “coronéis”.E alguns terão pensado que se trataria de pura fantasia de um grande e inesquecível escritor brasileiro.
Ora na verdade e na realidade não se tratava de pura fantasia, pois eu tive a oportunidade única de conhecer algumas daquelas figuras que no final da década de setenta e inicio da de oitenta, eu pensava que já teriam desaparecido, engolidas pela vertigem dos novos tempos e da modernidade que então já invadia aquele grande País.
Eu conto. Por razões profissionais, acompanhado de um jovem engenheiro brasileiro, saímos de Salvador em direcção a Mundo Novo e Morro do Chapéu com a intenção de visitar algumas das grandes fazendas onde muito se produz e onde predomina a criação de milhares de cabeças de gado.
Em duas delas, os episódios foram marcantes. Na primeira, o proprietário era o coronel Vicente, oitenta anos ainda muito rijos na sua seca figura, casado com uma roliça espanhola talvez com metade da sua idade.
Depois de animada conversa, mostrei interesse em ver um dos seus imensos rebanhos de gado e por ali fomos de carro por caminho difícil que terminámos andando a pé umas largas centenas de metros até que nos apareceu um mar imenso mar de cabeças do seu gado.
Quando chegámos junto da pequena cabana onde vivia um único pastor, de grande corpanzil, lembrei-me aflito que no carro deixara a pasta com diversos documentos e algum dinheiro e que as janelas estavam abertas por causa do imenso calor.
Ao revelar o motivo da minha apreensão, o tal pastor olhou para mim dos pés à cabeça e no seu vozeirão, sentenciou:
“ Não preocupa não, carro onde o coronel Vicente senta, ninguém chega perto ! “:
Foi assim e desta forma simples mas muito elucidativa que tive o meu primeiro contacto com a realidade e com o poder dos “coronéis de fazenda”.
Comprovei e aqui fica demonstrado que Jorge Amado pouco ou nada terá inventado !!!!
Voltando a essa inesquecível viagem pelo interior do Estado da Baía, recordo agora a visita a outra enorme Fazenda em dia de calor insuportável.
Saindo da estrada asfaltada, prosseguimos por uma espécie de picada africana com o carro enfrentando buracos e lombas com a possível galhardia e os seus ocupantes transpirando abundantemente e procurando não respira aquela poeira imensa.
Até que lá ao longe surgiu a casa, uma enorme construção térrea rodeada por uma varanda, como é usual p+ara aqueles lados e em quase todo o Brasil.
Não se vislumbrava ninguém até que saídos do carro, nos surgiu uma personagem feminina com pouca simpatia na face e que nos saudou de forma muito pouco cordial. Explicámos ao que íamos. Gostaríamos de visitar a Fazenda e sobretudo de conhecer e conversar com o seu Proprietário pois que nos tinham informado que seria um dos mais importantes da região.
Ao que ela respondeu que o Proprietário era o seu marido, Coronel e que o poderíamos encontrar num quarto ao fundo de um longo corredor que começava mal entrámos no casarão. A escuridão era quase total mas da última porta saía uma réstia de luz pela qual nos fomos orientando.
Ali chegados batemos à porta e um grande vozeirão permitiu a nossa entrada, o que fizemos de forma silenciosa e quase a medo, digo eu.
Também ali a luz não abundava mas em contrapartida, o cheiro era nauseabundo. Sentado num cadeirão lá estava o tal Coronel com uma perna assente num tamborete e coberta por um lençol de cor indefinida. Depois dos usuais cumprimentos e antes de entrar nas razões da nossa visita, perguntei o que se passava com a sua perna. Num gesto brusco, puxou o lençol e nós quase caímos logo para o lado porque a visão era terrifica. Uma ferida em avançado estado de gangrena, já se espalhando por uma área maior. Na minha aflição pelo espectáculo, pressuroso, perguntei se queria que o levasse ao hospital mais próximo.
A resposta veio rápida, nem pensar porque não era preciso pois o seu tratamento , cobrindo a ferida com teias de aranha, em breve traria a cura.
Aprenderam ?
CARAPAU DE CORRIDA
sábado, 4 de abril de 2009
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Li alguns livros do Jorge Amado e o ambiente era mesmo este - as Sanzalas, os Coronéis e os Jagunços.
ResponderExcluirBoa, Carapau.
Não é preciso ir tão longe.
ResponderExcluirO Coronel Loureiro, o Coronel Morais, o Coronel Coelho e muitos outros Coroneis e Generais já estão por cá e muito bem instalados.
Nunca li nada de Jorge Amado......mas sua (Carapau)escrita e a sua descricao tornam vivas as palavras e a imaginacao!
ResponderExcluirHitoria muito impressionante!