quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

...E não poderá criar-se em Portugal um sindicato dos alunos?

Aconteceu há dias no espaçoso auditório da Escola Secundária de Mem Martins. Perante uma centena de alunos fui reconhecendo naquela assembleia juvenil um quadro díspar daqueles preconceitos que em geral enquadram a visão do sistema educativo português e do muito precário interesse pela cultura por parte dos nossos estudantes mais jovens. "Geração rasca" foi um dos epítetos associados historicamente a tal juízo. Não sou profissional do ramo, ignoro se a experiência vivida naquele dia foi rara ou se, pelo contrário, poderia repetir-se em inúmeras escolas de outras regiões do País. Manifesto apenas a surpresa de se me ter deparado ali uma situação de Excelência – vocábulo tão em voga nos últimos tempos, porém nunca aplicado aos alunos.
Logo à entrada causou-me imensa satisfação o espaço da Mediateca, integrando um bem apetrechado sector audiovisual e uma biblioteca com centenas de volumes.
Tudo devidamente ordenado, classificado, denotando um plano de culturalização e promoção da literatura.
A sessão teve início com um vídeo excepcionalmente criativo sobre o tema de que iríamos falar. Um documentário dinâmico, pleno de inventividade técnica e... realizado pelos próprios alunos.
A surpresa seguinte, no prosseguimento da sessão, teve como protagonista uma aluna, de nome Carla, que transmitiu aos colegas, numa dissertação de vinte minutos e de improviso, com um nível lexical não aprendido decerto nos concursos televisivos, a essência de um romance de quase 400 páginas. Não se julgue esse exercício como resultante de um "empinanço" do livro ou de partes do livro. Não. O que a Carla fez, com admirável proficiência, foi uma leitura atentíssima da obra para depois não só gizar o enredo mas também e sobretudo realçar a filosofia e a pedagogia subjacentes, de forma mais ou menos discreta, à narrativa.
O espaço dedicado às perguntas, que se prolongou por uma boa hora, não foi menos cativante. Perguntas formuladas com imensa lucidez, objectividade, pertinência. Pobre de mim, tão necessitado ando de ânimo e confiança que não desperdicei o ensejo para me entregar, fraterna e familiarmente, aos meus jovens interlocutores. Não o teria feito com os alfabetizados funcionais com que me cruzo todos os dias. Assim, dei comigo a desenlaçar confidências que uma hora antes juraria não fazer.
Em silêncio me deliciei com apartes brevíssimos dos professores presentes. De facto, nas alusões a um autor, a um tema, a uma situação, lá estavam os mestres (professores Sérgio Quaresma e Luís Martins) advertindo os eventuais interessados para a possibilidade de consultarem um determinado livro na biblioteca ali ao lado.

Saí desta escola modelar com a tristeza de saber que outras (muitas outras?) estarão longe de alcançar um tão elevado nível de excelência.
Ocorreu-me então a ideia espaventosa de os nossos alunos do ensino básico e do secundário se organizarem, também eles, num briguento sindicato que reinvidique, estrepitosamente, obstinadamente, o "acesso garantido" a escolas excelentes.
Mesmo que nenhum, ou poucos, ascendam ao "topo da carreira".


Pedro Foyos
Jornalista

7 comentários:

  1. Pedro Foyos, estás quase completamente por fora, ou estás a brincar ??

    Sempre houve "sindicatos" de estudantes, até ao final dos anos 60 dominados pela extrema-direita, depois pelo PêCê, e na altura do 25.04 pelas diversas estremas-esquerdas.

    A coisa chamava-se movimento associativo, e não me digas por favor que nunca ouviste falar nisso...

    No secundário o nome da coisa era MAEESL, e eles eram fortíssimos em liceus importantes como o Pedro Nunes, o D.João de Castro, o Gil Vicente, o Amália, o Filipa de Vilhena, etc.

    Olha só, o João Carlos E. (Pedro Nunes, salvo erro) que agora anda armado em liberal e o raio-que-o-parta era um dos manda-chuvas...

    Não acredito nessa conversa de os putos de agora serem a geração "rasca" ou "x" ou "perdida", ou lá o que é.

    Acho que isso é apenas conversa de adultos que estão absolutamente a leste e não entendem nada, são incapazes de olhar o mundo com outros olhos que não os seus...

    :-(

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  2. O PF está a fazer, suponho eu, um paralelo com a pressão exercida pelos professores que ,assim, conseguiram atingir os seus objectivos.
    A questão de um real Sindicato não estava a ser equacionado mas o Alvega a 500 à hora, como é costume, passou por cima da mensagem...
    Trave, homem, se não ainda tem um ataque cardáco !

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  3. Se passei ao lado (ler e comentar aqui não é exactamente o meu destino, sorry P.G., I basically do what I fuckin' can...) tenho pena, lamento e etc.

    Há vida --- e quanta... --- para além daqui, há mutíssimos anos (poix...) e tudo, as solicitações são mais que muitas, again, so sorry if I missed the friggin' point and offended you.


    As coisas são como são, e o que não tem remédio remediado está.

    Fique bem,

    A.

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  4. Ah, e , acabei de reler o texto do P.F. e o teu comentário, e acho que vou passar umas horinhas a tentar decidir qual deles é que fax menos sentido...

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  5. Quanto a mim, o que está em questão, aqui, acima de tudo, é a qualidade da Escola e do Ensino, enquanto "formadores" de indivíduos e mentalidades...

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  6. Pois é, Pedro … mas, infelizmente, a Escola Secundária de Mem Martins é a excepção e não a regra !
    Entendi ( julgo, pelo menos …) a tua “mensagem “, ao sugerir, de uma forma sarcástica, a criação de um Sindicato dos Alunos e, sarcasticamente também, respondo: porque não ?
    Se já temos uma aberração chamada Sindicato dos Juízes ( que mais não é que uma forma promíscua de baralhar questões corporativas com posições de órgão de soberania) , o que impede os alunos ( que também não são uma classe profissional …) de ter o seu “Sindicato” ? Até já estou a imaginar a primeira reivindicação: “Se os Professores atingem todos o topo da carreira, nós também queremos progressão automática e sem exames até atribuição do Mestrado “ ! Ou há igualdade …

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