sábado, 25 de abril de 2009

Turista Acidente(al)

Prenderam-no quando fotografava a velha igreja ortodoxa, ao lado do paiol das munições.
Dois militares, entroncados e fardados de cinzento, pegaram-lhe por debaixo dos braços e atiraram-no, sem cerimónias, para a parte de trás do furgão.
Um pouco afastado, o oficial, pálido e olheirento , atirou fora o cigarro, que pisou, e soltou uma ordem breve, naquela língua áspera, que lhe arranhava os ouvidos.
De seguida, enfiaram-lhe um saco pela cabeça , e uma coronhada no baixo ventre, quando se tentou sentar melhor.
A viagem demorou cerca de meia hora.
O caminho sentia-se acidentado e com curvas apertadas, que o faziam dançar, sempre à espera de novo correctivo.
As poucas vezes que tentou balbuciar algo, ouviu frases no dialecto local, que o inibiram de prosseguir.
Quando o carro parou, sentiu um forte cheiro a combustível.
Empurraram-no para fora da viatura e quando o libertaram do capuz, fechou os olhos com o impacto do holofote que apontava para si.
Foi então amarrado a uma cadeira, com as mãos atrás das costas e as pernaspresas pelos tornozelos.
Nesse momento, entrou na pequena sala onde se encontrava, um outro militar, uniformizado,.este, de negro, que se lhe dirigiu num inglês quase perfeito, não fora as arestas pouco limadas de algumas das palavras.
“- Que faz na nossa bela, e acolhedora, terra
( pausa para olhar o passaporte)Mr.Walker ?”
“- Sou turista, vim passar uns dias de…”
O murro que lhe pareceu arrancar a cabeça do corpo,
surgiu do lado esquerdo.
Sentiu dois dentes a saltarem da boca e esta a encher-se de sangue.
“- Então, Mr…Walker, prefere a hard way ? Porque não confessa ?”
Enquanto tentava organizar os pensamentos, caiu-lhe o tecto em cima, ou pelo menos foi isso que lhe pareceu.
Afinal era um dos guardas que o vergastava com uma toalha molhada.
“-Trabalha para os gringos ou para os ingleses ?”
isto com um sorriso irónico, do militar de preto.
“Sou free lancer. Fotógrafo …”
Sem pressas ligaram-lhe dois eléctrodos ao mamilos.
“-Não quer repensar a resposta ?”
O seu silêncio foi entendido como uma negativa.
A corrente percorreu-o todo, como se estivesse na cadeira eléctrica.
Durante dois dias, foi espancado, torturado, sem comer, beber ou dormir.
Os guardas iam sendo substituídos e cada um, tinha a sua especialidade.
Arranque de unhas, queimaduras de cigarros,
cabeça mergulhada em baldes durante longos minutos.
Passadas 48 horas o primeiro oficial, de uniforme negro, concluiu:
“- É mesmo fotógrafo , deixem-no ir “.
E para ele “ Sorry, Mr.Walker…was a mistake !”

Deixaram-no à porta do Hotel.
Cambaleante subiu até ao quarto e deitou-se.
O camareiro entrou e deixou-lhe uma bandeja com comida,
sobre a cama.Quando ele saiu, desdobrou o guardanapo.
A pequena mensagem enrolada, caiu-lhe nas mãos.
“Parabéns Agente Walker. Informo-o que foi promovido
a Sub-Chefe do Departamento de Espionagem do Cazaquistão”.

5 comentários:

  1. Mais uma ETIQUETA ERRADA!
    Agora é que vou mesmo à tua gaveta...

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  2. Excelente, estou aqui que nem me tenho.
    Filme, a propósito:

    Rendition (2007)
    http://www.imdb.com/title/tt0804522/

    Tagline:
    What if someone you love...just disappeared?

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  3. Muito, mas muito bom...mas eles continuam por aí, só que agora já não são fotógrafos.

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  4. Margarida Ferreira dos Santos27 de abril de 2009 às 13:03

    Parabéns Walker!!!

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