Escrevo este texto no Alentejo.Lá fora, a temperatura ronda os zero graus.
Cá dentro, não será muito superior.
Quando me levantei, pelas oito da manhã, caíam uns fiapos de neve.
Um ventinho frio corta-nos a pele da cara, como gilette de má qualidade, o nariz e as pontas dos dedos viajam para o Reino do Gelo.
Espero, a qualquer momento, a visita do chefe dos esquimós, acompanhado pelo seu urso polar de estimação.
A burra, Rosa Porcalhota, Azeitona ou Pretinha, conforme os padrinhos, aparece-me mascarada de rena em vésperas de Natal.
No lago das carpas, que devem ter escohido hibernar, bem lá no fundo, parece-me vislumbrar a silhueta elegante de alguns pinguins.
O seu grasnar aristocrático, de animais habituados a cocktails e vernissages, mistura e confunde-se com o som arrogante dos marrecos e o cacarejar, popular e populista, das galinhas.
Por momentos, vêm-me à cabeça, os debates parlamentares.
Mas logo o frio se apodera, de novo, de mim.
As torneiras, da casa e do meu nariz, gotejam copiosamente.
Aperto o cachecol ao pescoço, enfio um gorro de lã cabeça abaixo, tento escrever de luvas calçadas...
Para descalçá-las, de imediato, pois assemelha-se a tocar piano com um martelo ou com um taco de baseball.
Bebo duas canecas fumegantes de café.
Como uma torrada estaladiça, meio esturricada.
Sinto, a insistência do frio, a invadir-me os ossos.
Os músculos a ficarem entorpecidos.
As batidas cardíacas a baixarem de ritmo.
A todo o instante, poderei ficar petrif...
