quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

XXXI - Procurado pela Polícia(?)

Mal entrei na ‘Estrela do Bairro’, apercebi-me que algo de estranho se estava a passar.
A D.Rosa, sempre tão maternal e efusiva, ao ver-me entrar no seu estabelecimento, baixou os olhos e fingiu estar a limpar uns copos, meio escondida pelo balcão.
Pelo contrário, o sr. Campos, o marido, parou o habitual pas de deux com a esfregona e ficou a contemplar-me com um ar vagamente imbecil.
A única coisa imutável, afinal, naquela manhã em que impusera a mim próprio esquecer um pouco o clima aventureiro dos últimos dias e dedicar-me de corpo inteiro e, mais importante, cabeça liberta de conspirações várias, à tradução do Robert Wilson.

Ao balcão o 25 Cents, ladeado pelos sempre presentes Biga Brôda e Kid Garoto, no regresso a casa de alguma rave party ou, mais provavelmente, de uma série de assaltos a gasolineiras, saudou-me com um
“ Fixe bróda !” sublinhado por uma espécie de sorriso, em que me pareceu entrever laivos de admiração.

Nesse momento, a repetição de um dos habituais blocos noticiosos, num dos televisores existentes na casa, explicou-me o que alterara os hábitos locais.
“ Foi hoje encontrado, na sua casa de, perto de Sintra o cadáver do conhecido intelectual da nossa praça António C. também conhecido como o Major, pesquisador de manuscritos antigos, historiador, cinéfilo inveterado, musicólogo de fama internacional, personagem multifacetada, homem de cultura vasta com correspondentes em todos os quadrantes do Mundo…”

Senti uma tontura. O António procurara-me e eu, como resposta, tinha optado por um duche rivogorante.
Mas já a pivot do telejornal, com um inapropriado sorriso afivelado, continuava, depois de ter mostrado imagens do exterior da moradia, situada na Várzea de Sintra.
“A polícia avança com a hipótese de suicídio, em virtude de ter sido encontrado, junto ao cadáver o revólver que lhe causou a morte. Contudo não está completamente posta de parte a hipótese de crime…”
Apercebi-me que estava longe de conseguir o almejado sossego mental. Crime? Mas quem é que poderia…?

Contudo, o pior, veio a seguir.
“ Sabe-se que a última ligação telefónica feita a partir da casa, insólita pela hora tardia, foi para outro investigador literário e tradutor, Nuno Quirino, que segundo as autoridades policiais vai ser contactado, de imediato, para se aclarar o seu envolvimento com este macabro acontecimento…”

Agora já era cúmplice, testemunha, mandante…nem, eu próprio, percebia de que é que estaria a ser suspeito.
Mas a locutora alargou o sorriso “ Notícias da última hora informam-nos de que o suspeito, ou presumível suspeito, não foi encontrado no seu domicilio…”
Pausa para respirar fundo ”...Passamos a nossa emissão para o repórter no local. Alô Jarbas Pintassilgo…”

Um jornalista com ar de bronco e a mão a agarrar o auricular entrou no ar em clima de grande nervosismo
” Pois é verdade, esse tal de Nuno Queiroz, perdão, Nunes Quirino, não se encontra em casa, o que não deixa de ser suspeito, dado o matinal da hora…”

Olhei o relógio. Nove e vinte, qual seria o conceito de madrugador para aquele pedaço de asno?

Agora percebia o ar suspeitoso e assustado com que a D.Rosa me continuava a olhar e o sorriso amistoso do 25 Cents, que via, em mim, um ‘colega’ no mundo do crime.

Um inspector com cara de fuinha respondia, entretanto, a uma série de perguntas feitas pelo repórter.
“ O senhor Quirino não é, ainda, suspeito…” apreciei o ênfase dado ao ‘ainda’ “…mas não colocamos de lado a hipótese de andar a ‘monte’…”
Dirigi-me à porta para ver se me apercebia onde estaria a Polícia e os media. Deveriam estar por perto…

Ia eu a meio do trajecto quando vários novos personagens fizeram a sua entrada em cena.
Os dois da frente, eram um brutamontes com aspecto de buldogue e o tal inspector com cara de fuinha.
Atrás o repórter, suado e mostrando grande excitação, seguido por um cameraman

2 comentários:

  1. Mataste o Major?!
    E agora, quêm é que fica com os galgos?!

    Vou deixar de ler esta história...

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  2. Ele não está morto, está é com uma bezana que nem de pé se consegue pôr !!!! Foi a russa que o deixou assim, infeliz, impotente e sem os galgos....

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