quinta-feira, 16 de abril de 2009

Um Conto nhonhinhas

Olhando-a, adivinha-se uma pessoa em harmonia com a Vida.
Alguém que saúda os dias como se fossem o primeiro
e os abraça intensamente como se fossem o último.
Não é difícil imaginá-la a acordar pela manhã,
capturando a luz do Sol e fazendo desta a centelha
que lhe fica a brilhar nos olhos marotos,
irradiando-a no sorriso aberto que se lhe rasga no rosto.
Quando perto dela é difícil, no mínimo, não ser tocado
pela alegria contagiante, numa manifesta e constante
boa disposição de espírito onde parece não haver lugar para nuvens.
É um arredar da seriedade cinzenta e monocórdica do quotidiano.
Stress? Sim, venha ele! Transformemo-lo numa azáfama
em tons de laranja, num turbilhão de emoção,
que ainda dará azo a uma gargalha ou outra,
provocada pelos lapsos induzidos pela pressão.
A Vida é, para ela, uma tela de mil e uma cores e com outras tantas tonalidades.
Por isso, para quê olhar apenas as mais escuras e sombrias, se as outras também lá estão?
Para quê recorrer ou centrar a atenção em apenas uma parte da vasta paleta?
Misture-se tudo! E assim vê ela o Mundo.
E canta! E canta mal e desafinada, mas canta!
E que lhe importa isso?
Sem vergonha, sem receio do que possa soar aos ouvidos dos demais, exprime a sua força de viver numa cacofonia desajeitada, que afinal é uma melodia mais bela e viva do que muitos poderiam conseguir dentro do tom.
Com toda esta energia e fúria pela vida chama, por pirraça, a todos os que não a têm ou demonstram uma atitude mais lamechas, de “nhonhinhas”, procurando evidenciar os seus semblantes cabisbaixos, que se deixam descolorir em tons pálidos e apagados.
Os “nhonhinhas” são, portanto, o oposto de si, longe daquela postura enérgica, feliz e bem disposta; descontraída e radiante.
O inverso da sua aparente imagem. E digo aparente porque se tivermos o cuidado de olhar bem, sem negar nada do que foi dito, apercebemo-nos que, a par da explosão de cor com que pinta os dias e tinge a Vida, não é de todo alheia às cores frias e cinzentas.
Recusando-as, conhece a sua existência.
Há os que trazem consigo o Sol e aqueles que apenas vislumbram o céu nublado.
Os primeiros, apesar de saberem a existência do Inverno, centram-se no calor e na luz do Verão, procurando a todo o custo evitar o toque da chuva e a sombra.
Os segundos, muitas vezes esquecem-se que acima das nuvens brilha o Astro Radioso.
Mas apesar de evitar o toque da chuva, não deixam de a ver e nem sempre lhe conseguem fugir, passar incólumes aos dias de tempestade.
Sentem os seus efeitos com maior intensidade.
Mas há que manter a máscara colorida e o sorriso desenhado.
Portanto, há uma recusa. Assumir é aceitar e render-se a algo que enfraquece e que acentua uma existência monocromática.
Ela é, no fundo, uma “nhonhinhas” não assumida.

Mas isso é um segredo nosso.
E aos que convivem com ela, resta invejá-la e agradecer
a partilha do céu azul, das flores,
do arco-íris e dos aromas quentes do Verão.

James Starfield

6 comentários:

  1. Não lhe chamaria um conto, mas a caracterização de um personagem. Que adorei e com quem me identifico.

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  2. Quem diria que seria aqui neste blog que eu ia encontrar a minha alma gémea?
    "Não lhe chamaria um conto...". Infelizmente não me identifico com o personagem porque sou mais do tipo "nhonhinhas".

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  3. Assumido ou não assumido, Adriano?

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  4. Gostei da personagem mas o conto(?) é nhonhinhas...

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