terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

XX - Os Cavaleiros do Ocidente

Mesmo, após alguma insistência da minha parte, a empregada continuou a afirmar que os dois homens que eu vira a almoçar, não passavam de criações da minha imaginação.
Tentei descrever melhor à ‘Foxy Lady’ aquele que eu observara bem, pois estava de frente para mim e não tirara os olhos dela.

“Bastante alto, de cabelo ondulado penteado para trás, blazer azul sobre camisa aberta, sem gravata …”
Percebi que despertara a atenção da minha companhia.” E sei que o conheço de qualquer lado. Penso que até o vi, recentemente, em qualquer coisa relacionada com as eleições…”
Pela maneira como a minha frase foi cortada, deu para entender que a arguta Cristina já deveria ter alguma suspeita acerca de quem eu estava a falar.
“ Bem, quem é que é esse meu ‘admirador secreto’ não interessa nada, de momento. Deixe-me, antes, contar-lhe toda a tramóia em que o Nuno está metido…”

Durante mais de uma hora, fui ouvindo o que parecia ser um argumento de filme de espionagem ou, melhor ainda, de um novo romance do John Le Carré.
Segundo a nossa head hunter, estava em curso uma conspiração de elementos muito poderosos, oriundos dos mais altos níveis do Poder – político, religioso, financeiro – que pretendiam tornar realidade o sonho de alguns, a unidade ibérica.
Entre essas pessoas, portuguesas e espanholas, contavam-se vários membros dos actuais, e passados, governos, alguns dos homens mais ricos de ambos os países, entre os quais o ‘nosso’ Comendador, figuras de destaque das artes, desportistas, enfim muitas das pessoas que estavam presentes, diariamente, nos noticiários mas, igualmente, outros, que manobravam na sombra.

Para os projectos megalómanos que tinham em mente - a união da península numa única e poderosa nação - eram precisos fundos inesgotáveis.
Apesar do investimento e apoio de alguns dos banqueiros envolvidos no projecto, embora, recentemente, duas dessas eminências pardas tivessem levado as instituições a que presidiam à mais vergonhosa e total falência, era, ainda, preciso muito mais capital.
“ E é aí que entra o Nuno…”
Abri a boca, num espanto sincero ”Eu?!??? Mas, as minhas poucas economias não chegam para nada…”
Nunca vira a ‘Foxy’ tão bem disposta”Ah, ah…não é por aí. O que eles esperam é que o Nuno consiga deslindar o mistério do Tesouro do Sindicato Libre.”

Esta expressão fez-me recuar ao manuscrito de Hemingway que me fizera estar acordado na véspera ( os meus dias estavam a ficar tão preenchidos que tudo parecia ter acontecido há mais de uma semana) e à sua fantasiosa teoria acerca de um tesouro colossal composto por jóias, ouros e quadros valiosíssimos envolvendo nomes como Goya, Velasquez e El Greco.
Todo esse espólio, que para o Nobel norte americano tinha o nome de Tesouro do Sindicato Libre, provinha dos roubos e pilhagens que o grupo de extermínio, com o mesmo nome, juntara após os assassínios dos principais militantes dos sindicatos existentes, muitos eles abastados comerciantes, industriais e membros de uma aristocracia  liberal.
Com a dissolução da Companhia de Jesus, esse tesouro fora aumentado e, segundo a lenda, tinha sido escondido em Gijón, onde durante os 13 dias que durara a Comuna das Astúrias, não tinha sido deixada pedra sobre pedra na sua busca.
Sem qualquer resultado aparente…

Continuando, ainda, na versão ’hemingwana’ da história, esse imenso conjunto de peças, de uma riqueza incalculável, estava algures escondido em território luso e no seu manuscrito poder-se-iam encontrar as pistas necessárias para a sua descoberta.
E, era com a minha argúcia e conhecimento das metáforas do grande escritor que, aquele grande e poderoso grupo de conspiradores secretos, contava, para a descoberta do tal espólio que lhes resolveria todos os problemas materiais e lhes poderia dar o alento necessário para o arranque final do objectivo que tinha em vista – a unificação ibérica.

Nessa altura da história, senti a necessidade de fazer a pergunta que há muito me arranhava a garganta.
“ E porque é que a Cristina está a trair a confiança do seu cliente e a contar-me tudo isto?”
A resposta não se fez esperar. Frases curtas, sintéticas e incisivas, marca registada da minha interlocutora.
“As hipóteses são várias. Porque, associada a si, posso ter acesso a uma parte do quinhão. Porque tenho nojo de toda esta escumalha para quem trabalho há anos, demasiados anos…”

E, depois de breves segundos de intervalo “…ou porque, conhecendo os métodos dos Cavaleiros do Ocidente, como eles mesmo se baptizaram, sei que nunca deixam pontas soltas, atrás de si…”
Os olhos claros fixaram-me “ …e eu não quero ser cúmplice da sua morte!”

4 comentários:

  1. Eleições? e tudo e tudo? isto ainda vai correr muita tinta

    ResponderExcluir
  2. Johnny tens que te começar a refrear nas alusões e referências, senão um gajo/a tinha que escrever uma 'coisa' do tamanho do teu texto (de cuja excelência não cabe dúvida...) só p'ra te poder acompanhar...

    :-)

    Na linha da Q., escolhendo só um assunto, há quanto tempo o Nuno não põe os butezinhos no Reina Sofia, onde há em permanentes esses quadrinhos todos à discrição e vontade do freguês ?


    ;-))

    ResponderExcluir
  3. Vou pôr a leitura toda em dia e depois comentarei...

    ResponderExcluir
  4. O Nuno ainda vai parar a uma reunião de cavaleiros rosa-cruz!
    Ai vai, vai...

    ResponderExcluir