terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

XXV - O encontro com a Marquesa

Como já terão certamente adivinhado tratava-se do Major, desta feita sem a companhia do galgo que, rapidamente, me informou da situação, misturando, como era seu hábito antigo, expressões inglesas com palavrões portugueses sem grandes preocupações com a cara de desagrado que alguns dos convidados, mais perto de nós, ostentavam.

O Comendador, como jogador seguro, resolvera apostar nos dois candidatos sugeridos pela ‘Foxy Lady’ e, assim, entregara também ao António C. uma cópia do manuscrito do Hemingway com o objectivo de que este analisasse o documento.
Soube, igualmente, que a verba que eu tinha auferido pelo trabalho era exactamente a mesma que ele recebera. Ao menos isso…
Só que, enquanto eu acreditava na proveniência do mesmo, pondo apenas em dúvida a veracidade do seu conteúdo, com o meu amigo passava-se exactamente o contrário.

O Major achava que o manuscrito era apócrifo, escrito por um perito na obra de Hemingway , mas que a história do tesouro poderia ter algum fundamento, pois há muito se ouvia falar num conjunto de jóias e peças de arte roubado durante a Guerra Civil espanhola e escondido junto à fronteira da Espanha com o território francês ou no Norte de Portugal, dependendo da fonte consultada.

Nesse momento, a nossa atenção foi chamada por um grupo ruidoso vestido à maneira dos passageiros do Mayflower que envolvera a companheira do Comendador, a tal Marquesa, com manifesto desagrado dos seus admiradores, que foram empurrados para junto à escadaria.

Entretanto, empregados vestidos à época do ilustre inventor, político e etc, passavam com enormes bandejas carregadas de canapés de salmão, caviar e outras iguarias, enquanto flutes de champagne eram distribuídas, em simultâneo.
O ambiente era descontraído, ruidoso e informal contrariamente ao que eu tinha antecipado, mas, mesmo assim, sentia-se alguma electricidade no ar, como que, a qualquer momento, fosse ocorrer algo de insólito.
Era em tudo isto que eu pensava enquanto o Major continuava a perorar acerca da sua teoria do tesouro escondido.

Senti, então, que alguém me olhava com insistência. Vi que era a Marquesa que, no meio dos ruidosos mascarados, me lançava uma súplica muda.
O cavalheirismo que já inúmeras vezes me deixara em situações complicadas, fez-me avançar resoluto e interpelar a aristocrata, como se de há muito a conhecesse “Marquesa, posso roubar-lhe uns breves momentos?”
Ela, percebendo a manobra, alinhou com um sorriso.
“Claro. Desculpem-me cavalheiros mas preciso de falar a sós com…este meu amigo.”

Quando nos afastámos dois metros, recompensou-me com o seu faíscante sorriso”Obrigado pelo seu gesto. Não sabia como é que me havia de desembaraçar daquela…gentinha.” e lembrando-se, de repente” Desculpe, não me apresentei. Chamo-me Cidália Vassalo, Marquesa de Caldelas, Dádá para os amigos…”
De novo o sorriso fascinante, os olhos com um brilho malicioso e a pergunta directa “ E como se chama o meu salvador?”

Ainda não recomposto da brusca passagem do título nobiliárquico para o petit nom com ares de Quinta da Marinha, respondi, reparando que o Major, cansado da espera, já se dirigia ao bar, localizado no canto da sala “Quintela, Nuno Quintela” e não resisti “…um mero plebeu!”

Apercebi-me que o meu nome não era desconhecido para a minha interlocutora.
A mudança de expressão e até de postura foram imediatas.
“Ah! Sim…não fazia ideia !”

A voz da ‘Foxy Lady’ fez-se ouvir nas minhas costas.
“ O Nuno é sempre o mesmo. Basta uma pessoa ir retocar a pintura e é trocada logo por outra!”

4 comentários:

  1. Cidália Vassalo é muito bom. Diria mesmo, é do melhor...

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  2. Eu também, e ainda me estou a rir !

    :-D

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  3. Realmente, Cidália, Vassalo, Dádá e Caldelas, não deveriam fazer parte do "curriculum" de uma marquesa...
    Frequentei, durante alguns anos, as termas de Caldelas, e não me lembro nada desta marquesa!

    E o Major que não estivesse já no bar...

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  4. Axo que já não está, tá na sala da TV a (re)ver um jogo de massacre...

    :-)

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