Não sei se é por ser Domingo de manhã.
Talvez o enevoado do dia tenha influência.
A chuvinha miúda não ajuda, por certo.
Mas a verdadeira causa da minha neura, a razão que me provoca urticária, a origem desta minha irritação quase permanente, é só uma.
O Natal, que se aproxima a passos, aparentemente, lentos e tranquilos, mas que, em menos de um fósforo, se transforma em vésperas do dito cujo...
E, então, já nada há a fazer.
Tudo começa, com umas musiquinhas algo inócuas, se é que no Natal existe alguma coisa que não seja premeditadamente calculada, tipo Jingle Bell em ritmo de house music ou White Christmas, na nova versão politicamente correcta, White&Black Christmas.
Depois as lojas engalanam-se de montras com neve, mesmo nos climas mais tropicais, cortam-se milhões de pinheiros vindos de centenas de enormes pinhais de plástico, algures na China, e começa-se a comprar papel lustroso e fitas de cetim, para reembrulhar os monos que nos deram no ano passado.
As bichas para os shoppings aumentam quilómetros, as revistas publicam Sugestões de Natal, os chefs ensinam receitas de Faisão Dourado do Nepal com Ovas de Esturjão do Mar Cáspio e redução de Balsâmico de Modena sobre Ninho de Alfafa da Etiópia, as habituais decoradoras freelancers, com habitat na Quinta da Marinha, decoram lindas mesas para 4 convidados, com 164 talheres e igual número de pratos e copos de cristal e as criancinhas, entre risos sonsos, escrevem longas listas de pedidos que incluem PSP's, Nintendos DS, IPhones ou um qualquer portátil topo de gama.
É a altura em que pessoas que nem se cumprimentam, quando sobem dez andares no mesmo elevador, começam a bater nos ombros umas das outras e a dizer"Se não nos virmos, Boas Festas!" ou, os mais conservadores"Um Feliz e Santo Natal, para si e toda a sua Família!".
E, já que falamos de Família, é no Natal que temos que aturar aquelas sobrinhas malcriadas que nos sujam, com as mãos cobertas de chocolate, o novo sofá da sala, com design italiano e que ainda estamos a pagar a prestações.
É, durante estas festividades, que entabulamos longas conversações com aquele cunhado adepto do Porto, que felizmente, durante o resto ano, nunca sai de Famalicão, mas que insiste em nos contar a estratégia do Jesualdo ou as jogadas do Hulk, nas últimas dez jornadas.
Reunidos numa sala onde, por hábito, nunca estão mais de cinco/seis pessoas reunem-se 34, a abrir garrafas de Asti que rebentam com estrondo e gargalhadas alvares, a comer sonhos gordurosos, filhozes recobertas de açúcar ou fatias de bolo-rei a que a ASAE tirou as favas( um dos poucos momentos altos, dos Natais passados, era a descoberta da fava e o, eventual, partir de um dente duma qualquer Tia mais velhota).
Por estas alturas, as televisões vão aos arquivos empoeirados buscar velhas relíquias com um musculoso Charlston Heston, Moisés ou Ben-Hur são os exemplos mais óbvios, a Christmas's Tale do Dickens ou um qualquer antigo preto/branco do Bing Crosby, onde todos os protagonistas se transformam em pink panthers, por via do colorido recente.
Esta é a época em que o consumo se apossa das pessoas, com muito mais intensidade e resultados nefastos do que a tão propalada H1N1, e sem sequer se poder recorrer a qualquer tipo de vacina, mesmo de discutíveis qualidades.
Finalmente, é por estes dias que começam a aparecer umas pálidas imitações de Pais Natais, com barbas fajutas, almofadas a fingirem barrigas, e fatos cerzidos de outros Carnavais...
Ouvem-se Ho, Ho, Hos, sem sotaque nem convicção.
E também isso me aborrece, profundamente.
Bem, mas a converseta já vai longa...
Ainda tenho que ir alimentar as renas,
e dar uma nova demão de tinta no trenó!!!
domingo, 6 de dezembro de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
E as decorações aqui nas casas que me circundam??? é que não há maneira de nos esquecermos de que ele está aí.
ResponderExcluirMeu querido Pai Natal, como te compreendo.
ResponderExcluirNesta época parece que vivemos num mundo de faz de conta e por isso tens todo o meu apoio neste teu desabafo que bem poderia ter sido escrito por mim se a tanto me ajudasse o meu engenho e arte .
Mas Pai Natal não te esqueças que deves a tua popularidade ao Menino que nasceu no dia 25 e também à loucura do consumo que leva a muitos sacrificios e bastante falta de bom senso.
Eu sei que não há nada a fazer e se não conseguimos colocar um travão, o melhor é fingir que alinhamos nesta representação de bondades e amizades que no resto ano parecem ter desaparecido.
Boa viagem nesse trenó já tão velhinho !
Este é o(um dos)tipo(s) de texto(s) que torna o Galo, um blog ímpar.
ResponderExcluirPara mim é sempre uma época terrivel, mas a verdade é que está aí de novo.
ResponderExcluirParabéns...ao Pai Natal!!!
Joao Viegas,
ResponderExcluirSou autor de um livro de micronarrativas. Gostaria de lhe propor uma troca de livros. Caso se interesse, entre em contato através deste e-mail: wgorjfagote@yahoo.com.br
Abraços.
W.G.
Para mim esta época só não é completamente angustiante porque existe alguém do meu passado que sabe exactamente o que comprar e para quem, porque como eu me estou nas tintas, também estou a branco.
ResponderExcluir(sei lá o que eles/elas querem)
:-(
um gajo não tem a obrigação de saber de tudo...e para mim esta 'coisa' está algures entre o comércio e a irrelevância
:-)
Lindo o Blog, perfeitos textos, parabéns.
ResponderExcluirAngústia (pré-) natalícia,
ResponderExcluira única solução é uma pessoa "entrincheirar-se" em casa, com o Rádio e a Televisão desligados, senão nem a publicidade nos larga...
Ainda é pior do que a Gripe!
Acho que me esqueci de dizer, fica agora dito:
ResponderExcluirO texto é absolutamente notável !
Muitos parabéns G. ...
:-)
Pergunto-me sempre, como é que deixámos que o Natal chegasse a este vazio? Começamos com angústias mal chega Novembro, começam a dominar-nos por esta altura e o desejo de que tudo isto passe depressa e termine, torna-se quase obsessivo!
ResponderExcluirO vazio é triste, a alma arrefece e a lucidez é quase devastadora!
Hopenhagen começa hoje...já não acredito no Pai Natal, mas sobre isto ainda consigo ter expectivas "moderamente" altas :)
Bom texto JV!
Belíssimo post Margarida !
ResponderExcluirSó fiquei intrigado sobre aonde será Hopenhagen , e o que diabo se lá passará...
brincando/pulling your leg .
:-)
Revejo-me em tudo Galo - texto e comentários. Todos eles, excelentes fotografias da minha alma. Pergunto: haverá assim tantas almas gémeas ou o que une o comum dos mortais é mais do que o que nos separa?(Frase gasta...mas muito verdadeira).
ResponderExcluirMargarida , se está mesmo interessada -- e não tenciona ir à Dinamarca -- tente ver o que dix o prof. Bjorn Lomborg , um jovem loiro e esperto da Business School Copenhagen sobre o assunto (consegue-se ver no programa do Martim Cabral e do Nuno Rogeiro na SIC Notícias... e na mesma coisa na i-net.)
ResponderExcluiro inglês dele é acima de impecável, mas não admira, 80 % dos cursos univ. lá são dados em inglês.