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Só quando fechei a porta do quarto do hotel nas minhas costas e me deixei cair em cima da cama, sem ao menos me descalçar, é que comecei a sentir a batida cardíaca a voltar à normalidade.
Deixei que a respiração se tornasse, de novo, compassada, forçando-me a expelir o ar com intervalos regulares.
Tudo correra mal, nesta última performance.
Bem, quase tudo...
Porque poderia muito bem, a estas horas, estar atrás das grades e nos jornais, em grandes parangonas"Descoberto o serial killer dos Crimes do Galo"ou, então, jornais televisivos a iniciarem com"Grande surpresa. Prisão em flagrante...".
Felizmente, no meio de todo o azar, a coisa até terminara bem.
De olhos postos no tecto, recordei os últimos momentos passados no atelier da Cardiga ( a propósito, tinha que me desfazer, rapidamente, da cópia da chave que roubara à pintora).
Depois de ter despido a rapariguinha, aqui do hotel, tinha-a amarrado a uma cadeira, que por lá estava, e amordaçado, de modo a que ela não tugisse nem mugisse.
Por cima da roupa, para evitar salpicos de sangue, vesti um macacão cinzento escuro e, como requinte de malvadez, enfiei um capuz que só deixava os olhos e a boca a descoberto. Quando me olhei no espelho do estúdio, achei-me uma figura verdadeiramente arrepiante.
Depois, fui à mochila buscar o estilete que já utilizara em várias das performances do Galo.
Uma excitação, quase sexual, começou a entorpecer-me as pernas.
Se as pessoas vulgares soubessem o prazer que antecede a execução de um homicídio, andavam todos para aí a matarem-se uns aos outros.
Não é que o não façam já hoje, e para isso o Rio é um bom exemplo de como a vida humana tem cada vez, menos valor.
Quando comecei a aproximar-me da jovem, a quem o pavor e o suor que lhe perlava a pele, tornavam ainda mais sensual, um relâmpago inundou de luz toda a habitação.
A surpresa tolheu-me os movimentos, por breves segundos. Com as portadas fechadas, o disparo da máquina fotográfica, pois de um flash se tratava, só podia vir de uma clarabóia, junto ao telhado, que não me dera ao trabalho de tapar.
Raciocinei. Mascarado como estava, ninguém me poderia reconhecer, mas para não deixar pontas soltas, teria que eliminar a minha convidada.
Com um golpe incisivo, espetei o estilete no coração da minha mais recente vítima.
Em duas passadas largas, alcancei a mochila com os meus pertences.
Sabia que todos os ateliers, geminados entre si, tinham portas de ligação que as pintoras, pelo menos as três que eu conhecia, deixavam entreabertas para se sentirem mais próximas e mais seguras.
Percorri as outras duas construções, fechando as ligações que ia cruzando, em menos de um fósforo.
Lá atrás, ouvi o barulho de uma porta a ser arrombada.
Enquanto os meus perseguidores ( Polícia? Quem mais poderia ser?) vasculhavam o estúdio, já eu saltara o gradeamento do jardim, desfizera-me do macacão e apanhara, pouco depois, um táxi para o hotel.
Afinal, vendo bem, as coisas talvez não tivessem corrido tão mal quanto isso...
segunda-feira, 7 de dezembro de 2009
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"Se as pessoas vulgares soubessem o prazer que antecede a execução de um homicídio, andavam todos para aí a matarem-se uns aos outros."
ResponderExcluirROFL !!
Flagra , seu J.V. ...
:-D
Seita satânica?!?!?
ResponderExcluirE alguém me explica porque desapareceu a imagem identificativa dos crimes do galo?
ResponderExcluirNegativo.
ResponderExcluirAinda, no último Crime cometido, o da Deolinda, o criminoso afirma, cito de cor,
" não sem antes ter deixado a imagem do pequeno galo sobre o murete"...
Neste caso da Marisa, foi apanhado de surpresa mas, mesmo assim, não sabemos, ainda, se terá deixado, ou não, a assinatura.
E que o Jaime Varela me perdoe, se estiver a dizer alguma coisa errada.