quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

O Palhaço - Mário Crespo

O palhaço compra empresas de alta tecnologia em Puerto Rico por milhões, vende-as em Marrocos por uma caixa de robalos e fica com o troco. E diz que não fez nada.
O palhaço compra acções não cotadas e num ano consegue que rendam 147,5 por cento. E acha bem.
O palhaço escuta as conversas dos outros e diz que está a ser escutado. O palhaço é um mentiroso.
O palhaço quer sempre maiorias. Absolutas. O palhaço é absoluto.
O palhaço é quem nos faz abster. Ou votar em branco. Ou escrever no boletim de voto que não gostamos de palhaços. O palhaço coloca notícias nos jornais. O palhaço torna-nos descrentes.
Um palhaço é igual a outro palhaço. E a outro. E são iguais entre si.
O palhaço mete medo. Porque está em todo o lado. E ataca sempre que pode.
E ataca sempre que o mandam. Sempre às escondidas.
Seja a dar pontapés nas costas de agricultores de milho transgénico seja a desviar as atenções para os ruídos de fundo.
Seja a instaurar processos. Seja a arquivar processos.
Porque o palhaço é só ruído de fundo. Pagam-lhe para ser isso com fundos públicos.
E ele vende-se por isso. Por qualquer preço.
O palhaço é cobarde. É um cobarde impiedoso.
É sempre desalmado quando espuma ofensas ou quando tapa a cara e ataca agricultores.
Depois diz que não fez nada. Ou pede desculpa.
O palhaço não tem vergonha. O palhaço está em comissões que tiram conclusões. Depois diz que não concluiu. E esconde-se atrás dos outros vociferando insultos.
O palhaço porta-se como um labrego no Parlamento, como um boçal nos conselhos de administração e é grosseiro nas entrevistas.
O palhaço está nas escolas a ensinar palhaçadas. E nos tribunais. Também.
O palhaço não tem género. Por isso, para ele, o género não conta. Tem o género que o mandam ter. Ou que lhe convém. Por isso pode casar com qualquer género. E fingir que tem género. Ou que não o tem.
O palhaço faz mal orçamentos. E depois rectifica-os. E diz que não dá dinheiro para desvarios. E depois dá. Porque o mandaram dar. E o palhaço cumpre.
E o palhaço nacionaliza bancos e fica com o dinheiro dos depositantes. Mas deixa depositantes na rua. Sem dinheiro. A fazerem figura de palhaços pobres.
O palhaço rouba. Dinheiro público. E quando se vê que roubou, quer que se diga que não roubou. Quer que se finja que não se viu nada.
Depois diz que quem viu o insulta. Porque viu o que não devia ver.
O palhaço é ruído de fundo que há-de acabar como todo o mal. Mas antes ainda vai viabilizar orçamentos e centros comerciais em cima de reservas da natureza, ocupar bancos e construir comboios que ninguém quer. Vai destruir estádios que construiu e que afinal ninguém queria. E vai fazer muito barulho com as suas pandeiretas digitais saracoteando-se em palhaçadas por comissões parlamentares, comarcas, ordens, jornais, gabinetes e presidências, conselhos e igrejas, escolas e asilos, roubando e violando porque acha que o pode fazer. Porque acha que é regimental e normal agredir violar e roubar.
E com isto o palhaço tem vindo a crescer e a ocupar espaço e a perder cada vez mais vergonha. O palhaço é inimputável. Porque não lhe tem acontecido nada desde que conseguiu uma passagem administrativa ou aprendeu o inglês dos técnicos e se tornou político. Este é o país do palhaço. Nós é que estamos a mais. E continuaremos a mais enquanto o deixarmos cá estar.
A escolha é simples.
Ou nós, ou o palhaço.

Mário Crespo

Enviado por João C./Margarida F. S.

9 comentários:

  1. Brilhante de facto. O Mário Crespo provavelmente vai durar muito pouco mas está a deixar uma marca forte. Belo post. Parabens.

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  2. Obrigado Mário Crespo, corajoso e bem claro ,dizendo aquilo que muitos de nós pensam mas não falam porque ninguem os escutará.
    Um senão apenas. Seria preciso terminar ressalvando que não pretende ofender os artistas palhaços, aqueles que nos fazem rir e que merecem o nosso carinho e aplauso.

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  3. MC sabe bem que estes palhaços não têm a escola do Chapitô nem de outras de Artes do Espectáculo. Este palhaço-tipo de q fala o MC vem do Circo. Mesmo. Mas do Romano. E nós somos os comidos, DEVORADOS!!!

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  4. Há um limite para a maledicência, sem fazer nem acontecer, só da garganta p'ra fora.

    O meu foi atingido, uma vex que... não interessa.

    Do ponto de vista literário, o texto é muito bom, valha-lhe isso.

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  5. Agora, já não estou para assuntos sérios...
    À minha frente, um ramo de flores amarelas, começou a abanar sózinho...
    Acabei de ver as notícias e houve um sismo ao largo do Cabo de S. Vicente - dois minutos!
    Esta noite, vou dormir de luz acesa, e não vou largar o meu gato de vista, "just in case"...

    O Mário Crespo, apesar de o ver pouco, também não é , para mim, uma estrela brilhante do jornalismo português...
    Mas já me disseram que, qualquer dia, vai ter o mesmo destino da Moura Guedes...

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  6. A terra realmente tremeu qualquer coisa, contudo aqui estamos num maciço rochoso, mal se sentiu, nem o meu cão se impressionou...

    ____________________________________________

    Agora sobre a substância:

    « La questione morale esiste da tempo, ma ormai essa è diventata la questione politica prima ed essenziale perché dalla sua soluzione dipende la ripresa di fiducia nelle istituzioni, la effettiva governabilità del paese e la tenuta del regime democratico. »


    Enrico Berlinguer de uma entrevista publicada no La Repubblica em 28 de Julho de 1981



    Não é preciso traduzir, suponho...

    :-)

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  7. Acabei de ouvir o Sr. Ministro da Administração Interna a afirmar que a Protecção Civil funcionou na perfeição!
    Pudera!
    Felizmente não aconteceu nada...

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  8. Essa parece como o ano passado... "...foi o ano que menos fogos teve...", pois pudera, não houve verão e calor pros fogos... e os que houveram foram apagagos pela chuva e não pelos bombeiros... mas sim, fica "bonito" dizer, e o que a maioria das pessoas querem é ouvir palavras bonitas que a lado nenhum nos levam.

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  9. De facto, já é tempo de os portugueses verbalizarem o que sentem. MC teve a coragem de dar o mote. Basta de palhaçadas! EStes palhaços - porque um palhaço atrai outros palhaços - viram-nos uns contra os outros, corroiem-nos as entranhas, esbanjam o dinheiro do nosso trabalho. Andamos anos a ver este "circo" que parece não ter fim! Mas o mal um dia tem fim! Precisamos que isso seja rápido! O palhaço ou nós, sim, como diz MC.

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