segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

IIIIIII RECEITUÁRIO DOMÉSTICO IIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII >>>>>>>Como repelir os vampiros que estão a enxamear o planeta

Uma pandemia, como o azar, nunca vem só. Não bastavam a crise e a virulenta Gripe A, cai-nos em cima, agora, uma praga vampírica como não se via desde o século XVIII. Publicaram-se em Portugal, durante o ano que está prestes a terminar, cerca de vinte livros de vampiros. Um profissional do ramo estima em meio milhão o total de exemplares impressos. Espantoso! Para este número muito contribuíram os quatro "best-sellers" de Stephanie Meyer que se mantêm há meses nos top's de vendas. A tetralogia já soma 42 milhões de livros nos cinco continentes. Mais modesta será naturalmente a facturação de uma antologia realizada por nove escritores portugueses, "Contos de Vampiros". Outro autor luso, isolado, vai erguendo uma saga subordinada ao título "Memórias de um Vampiro". Avassaladora é também a vaga pandémica na televisão: inúmeros canais por cabo têm dedicado atenção exaustiva ao fenómeno. À hora de fecho deste balanço, a situação em Portugal era a seguinte: a RTP1 transmite aos sábados "Diários do Vampiro"; a TVI prepara "Destino Imortal"; a SIC anuncia para breve "Lua Vermelha". No cinema destacam-se, entre outros, os filmes adaptados da saga de Meyer, o mais recente dos quais, "Lua Nova", exibe-se neste momento em 53 salas.
Inevitável, o filão é também explorado em outras áreas de mercado: dos ténis às T-shirts, dos calendários aos porta-chaves. Não faltarão parolos que neste Natal cederão à suprema incongruência de oferecer uma caixa de chocolates, marca "Vampyre", na qual se vê estampado em berrante quadricromia o Conde de Drácula, cuja predilecção pelo recheio da embalagem parece improvável.
De lastimar que nesta avalancha vampírica não se vislumbre uma frase, uma só palavra que responda ao essencial: Como deverão proceder os humanos de sangue ainda não corrompido para repelir (se possível, exterminar) os vampiros que estão a contaminar o planeta?
É nestas conjunturas de emergência que os cidadãos, perante a inacção dos sectores oficiais, recorrem esperançosamente ao Receituário Doméstico. Em boa hora o farão. Mais uma vez este Serviço Público não se eximirá do dever de bom aconselhamento, mesmo quando as questões, como a vertente, se afiguram irremediáveis.

1. DO CLÁSSICO ALHO ÀS ARMADILHAS

De entre os variadíssimos expedientes praticados desde tempos imemoriais com o fim de repelir os vampiros, o mais eficaz, económico e higiénico continua a ser o alho.
Exacto: o alho comum cultivado em toda a parte para condimento culinário. Devem preferir-se os dentes purpurescentes, de quilha verde despontada, pois esses concentram maior quantidade dos inigualáveis compostos sulfurados que os impregnam daquele cheiro activo tão característico. O alho, sabe-se, é um excelente imunizador contra uma infinidade de maleitas, inclusive as originadas por excessivo tempo de audição dos comentadores políticos e dos próprios agentes políticos. Já no século XVIII, em época de peste, era habitual ver-se o cirurgião trazendo «na boca, entalado, um dente de alho», gesto que por incúria não foi ainda adoptado pelos nossos governantes e demais personalidades de topo dos órgãos de soberania (uma excepção que nos é grato realçar: o presidente da Assembleia da República).
Já no século XVIII, como pode ver-se nesta imagem, algumas cabeças de alho eram indispensáveis nos "kit's" anti-vampíricos.

Uma propriedade da planta, menos conhecida, é o sulfureto de alilo, usado na confecção de cataplasmas em estados críticos de oxiuríase. Ora, nenhum vampiro, mesmo os que incarnaram em criaturas humanas, consegue suportar o odor do sulfureto de alilo. Esta vulnerabilidade, comum a todos os quirópteros, é especialmente notória no género vampyrus. A glândula parótida destes mamíferos voadores é bastante serosa e sensível, reagindo de imediato a determinados sulfuretos enérgicos, como é o caso do dito alilo. Observou-se em experiências laboratoriais que o vampiro começa por sentir uma enorme irritação no órgão glandular, seguindo-se forte sensação de náusea idêntica à detectada em telespectadores portugueses forçados a acompanhar debates parlamentares, não obstante o meritório esforço de um novo elenco de palhaços. Por fim, o vampiro agita-se, como que enlouquecido, tentando a todo o custo bater em retirada. Um conseguiu-o, certo dia, ocorrendo então o funesto episódio de esse quiróptero ter mordido o pescoço de uma líder partidária, acontecimento mantido desde então em blindado secretismo.
Um processo muito simples de aplicar o alho em redor de uma habitação consiste em introduzi-lo num almofariz e migá-lo com um cavaco bem escanhoado. Depois, espalhe-se a pasta um pouco por todo o lado, estrategicamente na proximidade de portas e janelas. Renove-se o preparado de três em três semanas. Os povos eslavos e balcânicos, com maior singeleza limitam-se a fazer um bom feixe de cabeças rechonchudas que pregam atrás da porta de entrada. Procedimento, aliás, praticado durante muito tempo, também em Lisboa, num palácio sito em Belém. Estranhamente, há alguns anos, o novo inquilino, logo no primeiro dia quebrou a tradição, berrando de longe, apopléctico, que removessem sem demora o molho de alhos.

As autoridades draculistas historiam um número imenso de tipos de armadilha para vampiros. Trata-se, em geral, de engenhos muito antigos cuja origem se perde na noite dos tempos. Este Receituário Doméstico aconselha, pela simplicidade, uma artimanha tributada a especialistas da Bulgária. Assim:
Arranje-se um pote grande e com boca larga. Por volta da meia-noite, encha-se o recipiente com sangue fresco e coloque-se o mesmo no local onde se suspeite da presença de vampiros. Não tardará o momento em que o primeiro vampiro, sedento e guloso, se aproxime e não resista a entrar no frasco. Tão logo isso suceda, tape-se a boca (do pote) e, num movimento lesto, arremesse-se a encomenda para uma fogueira ateada previamente. O autor do Receituário Doméstico testemunhou a eficácia do sistema, com resultados espectaculares, durante uma experiência realizada numa noite de luar, perto da sede da Associação Sindical dos Corruptores Oprimidos (ASCO).
Há quem, na falta de sangue, tenha tentado ludibriar o vampiro, enchendo o pote com sumo de tomate, mas o truque não resulta.




Pedro Foyos
Jornalista
A seguir:
O GRANDE EQUÍVOCO
DO CRUCIFIXO DE FERRO

3 comentários:

  1. Por acaso, já me tinha apercebido desta onda...vampiresca.
    Vou seguir os conselhos do PF.

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  2. Eu já não posso, já fui mordido.

    Atirem-me com alhos ou água-benta...

    ;-) ;-)

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  3. Occasum

    Autor: Orácio Felipe
    Descrição :
    Johann é imortal. Mas a imortalidade carrega consigo muitas angústias. A maior delas, a falta de um amor que a acompanhe. Ele buscava, como criatura das trevas, uma companheira que pudesse transformar. Ele buscava um antídoto e havia conquistado alguma força compondo poesias, admiradas tanto pelos seus criados, Igor e Fredy, quanto por aqueles que o perseguiam. Seus buquês de palavras, como costumava chamar, eram entregues àquelas que admirava. Mas havia uma única rosa em seu caminho, para a qual ele passaria a dedicar sua existência, que não era efêmera. Um vampiro buscando extinguir sua chama assassina através do amor de uma mulher.

    www.clubedosautores.com.br

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