quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Jantar no Bairro Alto

13

A noite ia já adiantada, quando Gabriela Torres e Teodorico Santana
abandonaram o decrépito edifício,
onde se situava o escritório deste último.
A Praça da Alegria começava a receber uma fauna,
onde velhas prostitutas se misturavam com esqueléticas criaturas
agarradas à droga, jovens estudantes subindo a pé em direcção ao
Príncipe Real, e os idosos locais que se espalhavam pelo jardim.
Passaram em frente à esquadra da Polícia e entraram no
velho Datsun, de cor indefinida, com que o detective mantinha
a sua mais demorada relação, de quase dez anos.
“- E vamos continuar a nossa conversa onde ?”
perguntou Teo, fazendo rodar a chave de ignição.
“- Estou a ficar com alguma fome” foi a lacónica resposta.
Teo fez rapidamente as contas às parcas notas
que lhe ocupavam os bolsos.
Parecendo adivinhar os seus pensamentos, Gabriela resolveu-lhe
o dilema. “- Claro está que sou eu que convido,
considere este jantar como o início do seu trabalho”.
Aliviado e incomodado, ao mesmo tempo, Teo arrancou
em direcção ao Bairro Alto,
seguindo as indicações da sua bela cliente.

Depois de estacionar o carro no parque do Camões,
subiram em silêncio até ao Casa Nostra, restaurante italiano
de que Teo nunca ouvira falar, mas cujo nome achou uma
curiosa ironia, dadas as actividades de Cassini.
Gabriela foi recebida com efusão pela dona que fingiu
não reparar na companhia da jovem.
“-Allora bella, onde está o Sérgio?”perguntou-lhe.
“- Em viagem de negócios, sempre em negócios…”
retorquiu-lhe esta.
Pouco depois, já sentados num dos cantos da pequena,
porém acolhedora, sala de refeições, Teo assistiu emudecido
à encomenda feita pela sua acompanhante.
“- Vamos começar com um Carpaccio di Bresaola com Rúcola,
depois continuamos com um Tagliatelle com Salmão
e terminamos com uma Panna Cotta.”
“- E para beber?”
inquiriu o empregado, solícito, debruçado em
demasia, pareceu a Teo, sobre o decote da sua vizinha de mesa.
“- Pode ser um Proseco…”
“- Para mim quero uma Superbock”
interrompeu Teo Santana,
já um pouco irritado pela sobranceria da sua nova cliente.
Gabriela não pode disfarçar um sorriso “- Desculpe, como sou
habituée, estava apenas a ser simpática e a escolher
os melhores pratos da casa. Mas se quiser fazer alguma alteração…”
Teo resmungou algo entre dentes e tentou mudar de assunto.
“- E por onde é que anda o seu marido?”.
“- O Sérgio está no Brasil para onde eu vou viajar depois de amanhã.
E é por isso que temos que combinar todos os pormenores,

porque eu quero contar com a sua presença lá,
enquanto estiver por aquelas paragens”.
O detective engasgou-se com o gricino que trincava, à falta do aipo,
e ficou sem resposta.

Lá fora, no escuro da entrada de um velho prédio,
Miltinho do Pagode observava a silhueta dos dois, bem visível,
através da pequena janela do restaurante.

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7 comentários:

  1. Lisboa, Paris, Madrid, Rio de Janeiro, muito cosmopolita...

    E uma cenazitas na província, não?

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  2. Oh Galo, essa do Datsun...comprado há 10 anos quando já devia ter vinte, ainda chega ao Bairro Alto? mas olhe adorei esta cena, sobretudo a imaginar a Paola a dizer "allora bella...". Muito bom.

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  3. E eu que também sou habitué, como a protagonista, do Casa Nostra se calhar
    cruzei-me com o casal...
    ou com a Quimera, quem sabe?

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  4. Pois, também não estou a ver a Paola a fazer isso...
    Mas seja como fôr, e parafraseando, 'Deus está em todo o lado, mas o Jaime Varela já lá esteve'.

    Parabéns !

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  5. Está tudo muito bem, mas já ia sendo altura do detective saltar para a espinha da modelo, não acham?

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  6. Ai que impaciência, Pedro. Eles ainda nem jantaram...e lembre-se que o Miltinho está de mirone.

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  7. Moira "Car Maniac" de Trabalho30 de setembro de 2009 às 15:44

    "Datsun... já não há! São p'ra mim!"
    Na sua época, feio que se farta;
    hoje, uma espécie de Mustang japonês.
    Like it!

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