O vaso era realmente imponente.
Com mais metro e meio de altura, era na verdade mais uma ânfora do que um vaso.
Uns braços laterais davam-lhe uma envergadura invulgar e as sardinheiras selvagens que irrompiam do seu interior faziam com que fosse uma peça invulgar no imenso espaço ajardinado, cujos limites eram demarcados por quatro estátuas de desenho clássico sobre pedestais monolíticos.
Depois do balde de água fria que fora a interrupção causada pela pergunta do caseiro, que motivara o eu ter-me vestido rapidamente enquanto ele permanecia no corredor, começava de novo a sentir a adrenalina de poder estar muito perto da descoberta do ‘tal’ tesouro.
Durante as duas horas seguintes trabalhámos em silêncio.
Primeiro sozinhos, e meia hora depois, com a presença irónica da ‘Foxy Lady’ cujo ar lavado, arranjado e cheiroso ( o tal perfume de canela) contrastava violentamente com o meu suor, mau cheiro e sujidade.
Tirámos toda a terra, e era muita, de dentro do vaso.
Verificámos que a terracota não tinha partes que soavam a oco.
Levámos o cuidado ao pormenor de escavarmos à volta do recipiente gigante, e nada…
O desalento e o cansaço começaram a apoderar-se de todos.
Mas a ‘Foxy Lady’ não queria desistir…
“ Ó Sr. Joaquim, mas não haverá outro vaso?!???”
O caseiro/segurança limpou o suor da testa com as costas da mão, encostou-se ao cabo da enxada e respondeu:
“Menina Cristina, eu conheço esta quinta como a palma das minhas mãos.
‘Basos’ há muitos, mas pequenos e modernos. ‘Baso’ antigo e grande …só ieste!”
Embora seja ateu, foi como se tivesse sido iluminado por uma luz divina.
De repente, tudo se me tornou claro…
“ Ó Ti Jaquim repita lá o que disse!”
“ O quêa? Disse que ‘baso’ grande …só ieste !”
Reportei-me à véspera, junto à estátua de Almeida Garrett, frente à Câmara Municipal. Como era mesmo a citação?
A minha memória fotográfica veio em meu auxílio, de novo.
“ Se na nossa cidade há muito quem troque o B pelo V, há muito pouco quem troque a Liberdade pela Escravidão”
Apercebi-me que ambos, Cristina e Joaquim, me olhavam sem perceber muito bem onde é que eu quereria chegar.
“ O nosso amigo Hemingway, como escritor, excelente escritor aliás, gostava muito de pistas ligadas à linguagem…às palavras…”
A impaciência de ‘Foxy’ manifestava-se já no sobrolho carregado.
Continuei, com calma “…às palavras, aos sotaques…”
Nem mesmo assim.
Resolvi avançar para o pormenor.
“ Por isso as pistas que deixou no cata-vento, porque foi ele certamente que as escreveu ou mandou escrever ao amigo pintor, não eram as pistas definitivas…”
Tirei o papel onde escrevera VEST e VASE e passei-o ao Ti Jaquim.
“ Importa-se de ler o que está aqui escrito?”
Depois de olhar para mim com ar desconfiado, o homem leu, com voz clara:
“ Então, é claro…BEST e BASE !!!”
quarta-feira, 17 de março de 2010
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