quinta-feira, 25 de março de 2010

LVI - A vizinha do lado

Quando duas horas depois deixei à Flor do Bairro rumo ao Lar doce Lar já ia mais reconciliado com o Mundo.

Por um lado o tal Caldo Verde bem fornecido com um chouriço das Beiras operara milagres na minha boa disposição.
E uma sandocha de carne assada em bom casqueiro continuara com a tarefa de me fazer regressar do ambiente de violências várias em que me movimentara nos últimos dias.
Para terminar a operação de reanimação e volta à vida, um prato de arroz doce polvilhado com canela.
A chegada da Rosinha, provavelmente avisada pela mãe, nas suas roupas cada vez mais diminutas e com as curvas cada vez mais expostas fez-me esquecer por momentos a Cristina e o seu desaparecimento para o qual não encontrava explicação.
Já a tinha tentado contactar por diversas vezes para o seu telemóvel mas sem êxito. Por onde andaria a ‘Foxy Lady’ e que papel teria ela desempenhado na morte do Ti Jaquim?
Mas nem a casual pergunta da filha da ‘patroa’ se eu me importaria de a ajudar a fazer um trabalho para a faculdade acerca da ‘Aldeia Global’ me afastou totalmente da minha mente a preocupação com aquela que tinha sido a minha companhia mais assídua nos últimos tempos.
Assídua…e estimulante. Todos os momentos que passara com a Cristina estavam impregnados de erotismo ou morte, sexo ou violência, mistério e aventura, ingredientes que misturados originam um cocktail muito forte de emoções.
Quando me dispunha a sair, já um pouco cansado do discurso do Telmo Tipógrafo contra as malfadezas do ‘ Pinóquio’, como ele apelidava agora o seu alvo principal, a Dona Rosa entregou-me um pacote “ São uns pastelinhos de nata para o caso do menino Nuno ter fome durante a noite…”.
Estava mesmo a precisar que me mimassem…

A obscuridade em que a rua se encontrava mas a figura de elevada estatura que saia do meu prédio fez-me lembrar o Mário Gavião que eu vislumbrara no restaurante de Sintra e no palacete da tal reunião dos Cavaleiros do Ocidente, onde o Organizador Chefe perorara...
Seria ele? E, em caso afirmativo, o que faria por aquelas bandas? Será que andava à minha procura?

Apressei o passo na tentativa vã de o alcançar mas ele meteu-se num Mercedes, que estava parado quase à porta, e afastou-se veloz.
Pelo sim pelo não tomei nota da matrícula. No dia seguinte iria contactar o meu amigo Ramirez da PJ…

Quando saí do elevador, no meu andar, deparei-me com a desmazelada da minha vizinha a colocar o caixote do lixo à porta como era habitual para, depois, o porteiro o trazer para baixo.

A cabeça coberta com uns rolos ridículos, a cara com uma qualquer pasta de cor verde ( se era um creme de beleza porque é que não funcionaria?) e o corpo que talvez até fosse jeitoso, envolto por um robe disforme que já vira melhores dias.

Laura Palma, era esse o seu nome, pareceu ficar surpreendida com a minha chegada mas perguntou-me em voz quase sussurrada, como era seu hábito “ Então Nuno tem estado fora?”

Respondi-lhe de lado, enquanto tentava abrir a porta “É verdade…mas já estou de volta”.
Contrariamente ao costume, ela tentou prolongar um pouco o diálogo:
“E está tudo bem consigo?”
Apeteceu-me gritar-lhe que não, não estava tudo bem comigo, mas que ela também não tinha nada com isso… mas respondi, apenas, um lacónico “Tudo bem…”

Só quando entrei em casa e fechei a porta é que me apercebi que a minha vizinha estava perfumada. Já era um bom começo…

3 comentários:

  1. Bem...mais um personagem? ainda não tinha ouvido falar desta Laura Palma. Isto está a ficar muito twin peaks...

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  2. Laura Palma, a vizinha do lado, aparece logo na descrição inicial dos personagens
    ( capítulo 1) e já surgiu depois disso em alguns episódios, sempre muito fugazmente...
    A Quimera como sendo a mais constante leitora da 'Amante...? ( diria mesmo, a única!)merece esta explicação.
    E, já agora, até ao final não irá aparecer nenhuma nova personagem !!!

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  3. Hmmm... nunca digas deste personagem não aparecerei.

    :-P

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