segunda-feira, 15 de março de 2010

XLVIII - Chuveiro com cheiro a canela

Quando chegámos à outra margem, a minha vontade imediata era ver o vaso, ou ‘baso’ segundo o Joaquim, que poderia ser o nosso destino final, mas o pragmatismo e bom senso da Cristina sugeriu que tomássemos primeiro um banho, já que nos encontrávamos completamente enlameados e, segundo ela, também porque uma chuveirada forte ir-nos-ia ajudar a relaxar, depois das emoções intensas porque acabáramos de passar.

Joaquim Rega, deu a aprovação final ao informar-nos, lacónico:
“ E eu aproveito para me ver livre desta ‘mercadoria’…”
Achei melhor fingir que não tinha ouvido nada e segui a minha companheira para o interior da casa.
Dentro da enorme moradia, imperava o silêncio.
A explicação encontrámo-la quando, ao subir a escadaria de acesso aos quartos, vislumbrámos o corpo da Dona Gertrudes caído no corredor que ligava estes à varanda, onde eu a vira em aparente discussão com a fogosa Vanessa.

Enquanto Cristina tentava reanimar a pobre senhora, eu fui-lhe buscar um copo de água que a fez acordar em poucos minutos.
Contou-nos ela então que, depois de nós embarcarmos, escutara a luso-francesa numa conversa telefónica em que uma das frases a deixou de sobreaviso “ Apressem-se, eles acabaram de sair…”
Ao ter pedido explicações acerca do significado de tal frase, tinha escutado, como resposta, uma série de impropérios e desaforos que a tinham feito dizer que iria telefonar, nesse mesmo momento, ao Comendador Salcedas para que esta despedisse a insurrecta…
Tinha sido, ao voltar costas à jovem, a fim de cumprir a ameaça, que se sentira golpeada pelas costas sem ter qualquer tipo de noção de como tudo se passara, acordando apenas connosco a abaná-la e com um grande ‘galo’ no alto da cabeça.
Transportei a anciã para o seu quarto, cheio de santinhos e imagens religiosas, corri os reposteiros e deixei-a, na penumbra.

Pelos vistos, não fora só a nós que as emoções fortes tinham feito uma visita…

Desci para informar o Joaquim do que se passava e encontrei-o junto à instalação agropecuária da herdade.
Não percebi se se teria já visto livre da tal ‘mercadoria’ mas não lhe fiz qualquer pergunta nesse sentido.
Quanto menos soubesse sobre o assunto, melhor.
Quando lhe contei o que se passara, mesmo antes de se preocupar com o estado físico da governanta, correu para a garagem para perceber se faltava algum veículo, já que a Vanessa não tinha viatura próxima.
Como já temíamos, esta escapulira-se ao volante de um Ferrari wallpaper, um dos inúmeros carros de colecção que o Comendador amontoava na espaçosa garagem nortenha.
Perante a minha admiração, Joaquim informou - me, num misto de orgulho e embaraço “ E ‘habia’ de ‘ber’ os que ele tem na garagem da Foz” e, atrapalhado”…mas este Ferrari era um dos seus preferidos. Nem sei como é que lhe vou dar a notícia…”
Ofereci-me para ser eu a ligar para o Comendador, mas o caseiro recusou.
Quando me voltei a dirigir para casa, já ele falava com o Salcedas…

Como já disse antes, o quarto da Cristina e o meu são contíguos.
A porta para o corredor do dela estava aberta e, depois de ter batido, sem obter resposta, entrei para saber novidades da Dona Gertrudes.
O barulho do chuveiro, era a razão porque ela não respondera.
Pelo vidro fosco da box, entrevi o corpo nu da minha companheira de aventuras.
Cristina era uma fausse maigre.
Apesar do seu corpo esguio, da agilidade dos movimentos, a semi transparência da porta do chuveiro, permitia entrever as curvas sinuosas, a sensualidade dos quadris, o arredondado das nádegas…
No ar um cheiro a canela…

Absorto por aquele momento de beleza pura, não me apercebi que a minha intrusão poderia ser mal interpretada.
Só caí em mim, quando ouvi” Então está a gostar do espectáculo? Não vai entrar?”

Um comentário:

  1. Gosto do título deste episódio.Já o que ele augura, não sei não. Com essa misteriosa mercadoria...

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