quarta-feira, 14 de abril de 2010

Marco Polo e os 'Abreus'

As minha primeiras Viagens foram as do Gulliver.
Depois dei a Volta ao Mundo em 80 dias.
Andei Duas semanas em Balão, passei Dois anos de férias com o Robison Crusoé,
mergulhei a 20 000 léguas submarinas, vi a Moby Dick e descobri a Ilha do Tesouro.
Tornei-me mais ambicioso.
Fui da Terra à Lua, em várias companhias (...aéreas, claro).
Com o velho Júlio, o Verne, e com o meu colega de carteira e calças à golf, Tintin, o repórter belga.
Este último proporcionou-me, aliás, outras viagens inesquecíveis.
A estreia na América, no País dos Sovietes, na Ásia, no Congo, na Sildávia, na Amazónia...
Viagens de piroga e de foguetão, em bimotores ruidosos e comboios cheios de charme, com que percorri as sete partidas do mundo, muito antes deste me pregar outras partidas.

Sinto que o verdadeiro baptismo que me transformou de viajante virtual em globe trotter real foi a travessia de Lisboa para Nacala, durante cerca de um mês, a bordo do Niassa.
Foi essa, realmente, a minha grande primeira viagem.
Pelo que teve de novidade, pela mudança de continente, pelos dois anos que se adivinhavam longe da 'terrinha'...

E, desde sempre, a minha postura foi a mesma.
Respeito pelos costumes, tradições, hábitos e culturas locais. Curiosidade em experimentar a gastronomia do lugar, ter amigos naturais do sítio, conhecer os recantos mais escondidos, sem comparações colonialistas em que as nossas rotinas saiem sempre enaltecidas e valorizadas.
Sempre quiz aprender e apreender, sair enriquecido e não converter, ser um observador e não um missionário...

Depois disso viajei de Tegucigalpa a Taquelepaque e de Cantão à Costa do Marfim.
Sem risos trocistas sobre as práticas locais, sem autocarros com ar condicionado e guias equivalentes, sem o espírito de cruzados actuais com que multidões de turistas ( ...e não viajantes) armados de webcams e máquinas digitais, aterram em manadas, dispostos a comprar souvenirs de Punta Cana, discutir num qualquer mercado de Casablanca em arremedos de palhaço rico ou tentarem trazer um pedacinho da Muralha da China para colocar junto ao plasma que têm na sala e onde passam intermináveis sessões dos 'documentários' feitos durante essas férias magníficas 'Olháli o Santos a galar a chinoca em Bangcock'.

Os açoreanos com todo o seu sentido de humor, contido e reservado, chamam a essas hordas de novos bárbaros, os 'Abreus'.
Por analogia com a Viagens Abreu, grande impulsionadora da democratização de viagens a 'preços em conta' para destinos 'exóticos'.
Que fique claro que eu não sou defensor do elitismo das viagens.
Da volta ao Oriente Expresso em que determinadas clases sociais só podiam viajar se fossem damas de companhia das marquesas desta vida.
Da ida a Badajoz para 'o povo' ir comprar caramelos.
Mas custa-me ver manadas de 'japoneses' de Gaia ou da Mealhada a invadirem praças e mesquitas, esplanadas e museus, com a boçalidade nacional que alastra a uma grande velocidade e que se manifesta com sintomas mais profundos quando os 'tugas' saiem deste nosso pedacinho, quando se encontram em grupo e se deparam com outras raças ou credos.

Do 'orgulhosamente sós' para o 'alarvemente acompanhados'...

2 comentários:

  1. Não vou comentar a substância desse teu post, estou em sintonia...

    :-)


    (Uma das minhas amigas brazucas --- legítima cearense candanga di Brasília, arquitecta pela UNB --- dizia com muita graça "qui no estériô quero conhecê brasilêro não, mi finjú di amêricana"...)


    Só uma notita marginal:

    Nós os dois não somos exactamente da mesma idade, contudo axo que deixaste de fora das tuas leiturinhas os Salgaris (do Sandokan ao 'Corsário Vermelho'...) e também aquelas 'preciosidades' da colecção "Óscar Romano Torres" (??) que me valiam 18's e 19's em redacção no Colégio A. porque a D. Domitília nunca tinha lido aquilo e pensava que aquelas efabulações eram da minha lavra...

    :-D (lol !)

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  2. Indirectamente aqui está uma boa publicidade e quase hoemnagem aos "Abreus Agencia"...pois levam ao exterior milhares de portugas que assim se banham em novas culturas e aprendem o que é civismo, algo que ainda cá não chegou !!!

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