sábado, 3 de janeiro de 2009

Obrigado, Obrigado...Amália!

Há muitos anos atrás, no Tempo em que os Animais falavam (... embora muitos continuem ainda a discursar!) sempre que se saía deste Jardim à Beira Mar plantado, o que não se fazia com a desenvoltura dos nossos dias, e se falava que eramos de Portugal, quatro situações podiam acontecer.
Os mais ignorantes confundiam Portugal com outros países começados por P, por exemplo Porto Rico, como aconteceu comigo; o habitual era pensarem que Portugal era uma província ou cidade de Espanha; outros diziam, com algum desprezo, que era uma terra atrasada com um Ditador tacanho e, ainda, colónias em África; e finalmente havia sempre um grupo que sabia que era a terra da Amália, e do Eusébio ( que um dia destes também estará connosco aqui no "Galo").
Amália, ao actuar em salas de nível internacional como o Olympia de Paris, no Festival de Cannes, no Lincoln Center em Nova Iorque, no Hollywood Bowl em Los Angeles, no Canecão do Rio de Janeiro, e ao efectuar tounées por Espanha, França, Itália, Bélgica, Alemanha, Holanda,Suécia, Dinamarca, Brasil, Argentina, Uruguai, Chile,Venezuela, México, Estados Unidos, Canadá, Japão, Israel, Argélia, África do Sul, Rodésia, Angola e Moçambique,
tornou-nos, a todos nós, menos saloios e um pouco mais cosmopolitas.

Quem teve a sorte, e a honra, de assistir a alguns dos espectáculos de Amália, nunca esquecerá, para além das actuações, quase sempre deslumbrantes,
o seu modo de agradecer"Obrigado.Obrigado..."
Uma forma, em simultâneo, simples, generosa e popular, mas também aristocrata, com tudo o que esta palavra tem de positivo, de uma Diva que sabia ter todas as plateias nas mãos.
E Amália era, na realidade, uma Diva como Edith Piaf, Bessie Smith, Billie Holiday ou Maria Callas( chamavam-lhe, inclusive a Callas do Fado).
Originária de um meio muito modesto, Amália, nasceu em Lisboa por acaso, a família era toda da Beira Baixa, para onde a Mãe regressou quando ela tinha 14 meses, tendo ficado à guarda da Avó até aos 14 anos.
Esteve para ser Maria do Carmo mas, para bem de todos nós, ficou Amália...
Aos nove anos, começou a frequentar a Escola na Ajuda, mas sem livros porque não havia dinheiro para isso. Aos doze deixou os estudos, e foi aprender o ofício de bordadeira.
E aos 14 anos, como dito acima, voltou para casa dos Pais.













A vida profissional, depois de umas cantorias amadoras nas Marchas de Lisboa, começou no Retiro da Severa, onde actuavam também Alfredo Marceneiro e Berta Cardoso, entre outros grandes nomes da época.
Rapidamente, a jovem fadista caiu nas graças de um público, cada vez mais numeroso, passando a ganhar um conto de réis por dia enquanto os seus colegas se ficavam pelos 50 escudos diários.
Já nessa altura cantava Poetas como Linhares Barbosa e Frederico de Brito, e ia escrevendo algumas coisas que não dizia serem suas, como a quadra seguinte:

"Entrei na vida a cantar
E o meu primeiro lamento
Se foi cantado a chorar
Foi logo com sentimento"

Aos 23 anos, depois de um casamento falhado,
Amália era uma mulher interessante,
de uma beleza estranha e diferente, rodeada de admiradores.
Ricardo Espírito Santo, banqueiro e admirador das Artes,
talvez tenha sido o nome mais sonante,
mas de todos os quadrantes políticos, intelectuais e financeiros
ocorriam ferverosos apaixonados,
que a acompanharam pela vida fora.



Começou então a carreira internacional,
primeiro por Espanha e logo depois pelo Brasil onde sucessivas tounées lhe grangearam uma popularidade sempre crescente, que duraria dezenas de anos.
Em simultâneo, experimentou o Cinema, estreando-se
com Capas Negras, a que se seguiu
o Fado, História de uma Cantadeira.
Sol e Touros,Vendaval Maravilhoso,
Les Amants du Tage, April in Portugal, Sangue Toureiro
ou As Ilhas Encantadas são alguns dos outros filmes
em que Amália participou, sob direcção de Perdigão Queiroga, Leitão de Barros, Henri Verneuil, Augusto Fraga,
Jorge Brum do Canto ou Carlos Vilardebó.


Uma das características positivas e diferenciadoras
da carreira desta nossa embaixatriz
foi ter dado a conhecer muitos dos nossos Poetas.
Camões, Pedro Homem de Mello, Manuel Alegre,
David Mourão- Ferreira, Alexandre O'Neill
ou José Carlos Ary dos Santos,
escreveram algumas das mais inspiradas letras de Fados como Erros Meus, Povo que lavas no Rio, Meu Amor é Marinheiro,Barco Negro, Gaivota ou Alfama, para mencionar apenas uma obra por autor,
seguindo a ordem acima.





O 25 de Abril, com o seu imenso conjunto de aspectos positivos, mas também com a sua quota parte de injustiças, tornou Amália, durante algum tempo, persona non grata.
Fascista, e membro da PIDE para uns, Comunista para outros, este é um período em que a relação mesquinha, míope e tacanha de certas camadas do Povo para a Grande Amália, só nos envergonha a todos como Raça e como Nação.
Mas depois tudo passou, e voltaram as Honras e Comendas...





Entre os principais Prémios e Medalhas que Amália recebeu, contam-se o de Comendador
da Ordem das Artes
e das Letras(França),
Diapasão de Ouro para a
Melhor Cantora
da Europa(Itália),
Oficial da Ordem Militar de Santiago(Espanha),
Grande Medalha de Prata da Cidade de Paris, Prémio SNI para a Melhor Acrtiz de Cinema, Medalha de Ouro da Cidade de Lisboa e do Porto e Grande Oficial da Ordem do Infante D.Henrique.


A família de Amália era muito grande.
A sua Avó teve dezasseis Filhos e ela própria,
tinha quatro irmãos e cinco irmãs,
sendo a mais conhecida, Celeste Rodrigues,
que seguiu também a carreira de Fadista,
embora sempre à sombra,
e sofrendo da comparação com a Irmã genial.






















Contrariamente a Ícons de outras paragens como Marylin Monroe, nos Estados Unidos, pintada por Andy Warhol ou Brigitte Bardot, retratada por Picasso, Amália nunca encontrou um Artista plástico português que tivesse conseguido reproduzir todo o seu carisma e visual fora do comum.

A sua amiga Maluda, Pintora de reconhecido talento em determinadas áreas, retrataria a Fadista em várias obras, académicas e sensaboronas e até Leonel Moura, numa abordagem mais moderna, não alcançaria grandes resultados.


Uma Vida rica e preenchida como
a de Amália Rodrigues não se pode resumir
no espaço de um post.
Ficaram de fora os Programas de Televisão, o Teatro,
a Discografia, o segundo Casamento, eu sei lá...


Antes de um pequeno vídeo
deixemos
algumas palavras
de um grande escritor francês.
"Amália é um fenómeno só comparável a Nijinsky"
André Maurois



4 comentários:

  1. As palavras não chegam para "dizer" sobre Amália.
    Por isso, apenas uma pequena história de bastidores.
    Há dez anos atrás, em Maio de 1998, a Companhia de Bailado de Pina Bausch actuou em Lisboa, no âmbito do Festival dos Cem Dias, que decorreu pela altura da realização da Expo 98.
    Tratava-se de uma nova coreografia, inspirada em Lisboa mas abrangendo, igualmente, os outros mundos da língua portuguesa e que incluía, obviamente, dois fados de Amãlia.
    As duas Divas conheceram-se na altura e Pina Bausch foi convidada para um jantar organizado, então, em honra de Amália.
    Perante a justificação e o quase pedido de desculpa que lhe foi apresentado, pelo facto de não ficar sentada ao lado de Amália, Pina Bausch respondeu apenas constituir, para si, a maior das honras, poder sentar-se na mesma mesa em que se sentava também Amália Rodrigues...

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  2. Como de costume,Contessa, tens razão.
    As palavras, pelo menos as minhas, são mais do que insuficientes, ou menos, para falar de Amália e dos sentimentos e emoções que ela despertava.

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  3. confesso ser apaixonada por esta voz, por esta figura... para além de ser viciada em fado, de ter ido ao fantástico musical de Filipe La Féria, à poucos dias fui ver "Amália, O Filme" e para além de ser a única pessoa com a minha faixa etária presente naquela sala, passei o filme a cantar e acabei com uma lágrimazita a espreitar... parabens pelo post Galo, adorei!
    Su

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  4. Quando li que tinha passado a projecção do filme a cantar, é que eu percebi porque é que tantos espectadores abandonaram a sala...

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