quinta-feira, 21 de maio de 2009

O novo Terreiro do Paço

vira o disco e toca o mesmo
«A mim, preocupa-me não os revestimentos do chão,
nem tão pouco o trânsito em redor da praça;
tão unicamente, a caracterização e utilização
da praça como espaço urbano “de estar”,
assim como uma grande sala.»
In Público (2/4/2009) Ana Henriques
«Arquitecto responsável pela remodelação da Praça do Comércio apresentou ontem os seus planos à Câmara de Lisboa. Não haverá calçada portuguesa no terreiro. (…)
É um Terreiro do Paço dividido ao meio por um corredor entre o arco da Rua Augusta e o rio, aquele que o arquitecto responsável pela remodelação da praça, Bruno Soares, ontem apresentou à Câmara de Lisboa.(…)

Mas pelas explicações dadas pelos autarcas à comunicação social percebe-se que abdicou de soluções mais tradicionais, como a calçada portuguesa.
Bruno Soares optou por um pavimento amarelo-ocre onde surgem alguns losangos de basalto negro a contrastar com o chão cor de terra. Em redor da estátua de D. José haverá mármore verde a chamar a atenção para o monumento de bronze. "Achei a solução bastante interessante e arrojada. Mas vai dar discussão", preveniu a vereadora independente Helena Roseta. Acima de tudo, agradaram aos autarcas os detalhes técnicos: a praça vai ser infra-estruturada para receber espectáculos - que serão pontuais - e a drenagem das águas pluviais também não foi esquecida. De resto, é o que já se sabia: passeios mais largos e o trânsito a passar apenas nas ruas paralelas ao rio.
A Rua do Arsenal fica reservada aos transportes públicos e a Ribeira das Naus aos automóveis. Nas laterais da praça não haverá trânsito - apenas esplanadas e eventualmente comércio debaixo das arcadas, no rés-do-chão dos ministérios. "Parece-me uma proposta muito consistente", declarou ainda Helena Roseta. O tipo e a cor do pavimento servirão também para distinguir os vários usos da praça. Assim, o tal corredor entre o arco da Rua Augusta e o rio, feito num material diferenciado do restante, servirá para assinalar um percurso pedonal de fruição do local. A área do cais das colunas terá igualmente um pavimento próprio.
Árvores, como já ali existiram noutros tempos, não haverá. Bruno Soares disse que quando for preciso criar zonas de sombra por causa do calor será preferível montar toldos. A solução não é consensual: "Não sei se não seria melhor haver árvores", observou a vereadora comunista Rita Magrinho. (…) Já o independente Carmona Rodrigues vê com bons olhos a divisão do Terreiro do Paço ao meio pelo corredor em direcção ao rio: "Um dos problemas da praça é a sua dimensão quase excessiva". A ser aprovada, esta solução deverá estar concretizada em Outubro 2010, para as comemorações do centenário da República. »
É sempre uma questão de ponto de vista.
Com certeza vai gerar celeuma, ou não fosse hábito as opiniões divergentes dos portugueses em geral e dos alfacinhas em particular.
Acho até que é uma das nossas melhores característica: expressar opiniões, de preferência contra.
Eu também sou pelas árvores, se tecnicamente possível (p. ex. se houver cota suficiente de terreno abaixo do pavimento, para as raízes).
Gosto muito de ver a Praça nas fotos antigas quando ostentava árvores e que, além de sombra, conferem sempre um ar de coisa viva ao cenário.
No entanto, parece-me má ideia optar por soluções só porque em tempos já foi assim: quer-se calçada portuguesa porque já ali existiu e é típica da cidade.
Se formos por aí, então ergam-se novos pelourinhos para queimar bruxas que também já lá estiveram.
Temos que reconhecer que apesar de muito bonita e característica, a calçada portuguesa não é de todo confortável para caminhar e, devido à consistência multifacetada da sua superfície, tem tendência para criar depressões e abrir buracos.
E depois acrescem os custos de manutenção.
A mim, preocupa-me apenas e só uma coisa: não os revestimentos do chão, nem tão pouco o trânsito em redor da praça.
Tão simplesmente a caracterização e utilização da praça como espaço urbano “de estar”, assim como uma grande sala. Essa preocupação deverá, em meu entender, estar no topo dos objectivos que ali se devem atingir ou a praça permanecerá “às moscas”, como tem sido habitual, ou mais raramente “aos barris”.
Há petróleo no… Terreiro!
É certo que não podemos comparar o Terreiro do Paço à Plaza Mayor ou mesmo a Trafalgar Square, simplesmente porque este nosso quadrado urbano tem um lado aberto ao rio – que ali mais parece mar. Portanto, as intempéries serão, seguramente, imprescindíveis de controlar, seja de que forma for [vide Estação do Oriente].
Diversas utilizações foram, por isso mesmo, dadas à praça ao longo dos anos de modo a não incluírem o termo “estar” mas sim “de passagem”.
E os carros estacionados foram, durante anos, o mais claro exemplo dessa política.
Sinceramente, não me parece que toldos possam cumprir essa função.
Depende da sua configuração mas, já que estamos com as mãos na massa, porque não aproveitar para retirar o ar de parque de estacionamento vazio à praça?
Sei lá, umas construções artísticas, mais ou menos fixas, que pudessem dar nova interpretação à volumetria urbana e, em simultâneo, albergassem espaços de estar.
Esse “estar” podia ser tão amplo como ‘esplanar’, deitar na relva, abrigar sob uma árvore, percorrer instalações sazonais ou qualquer outra interpretação que se queira dar ao verbo. Lembrei-me do Richard Serra e das suas esculturas habitáveis.
É que esta coisa do limpinho e lisinho irrita-me.
Mais descaracterizado não há.
Os técnicos chamam-lhe “espaço expectante”.
Não tem lá nada para que qualquer coisa possa ser ali colocada no futuro e depois, coisa nenhuma surge, não vá conspurcar a brancura do cenário.
Antes os carros lá estacionados! A praça ficou feia, é certo, mas ao menos tínhamos
o parque de estacionamento mais bonito da Europa!
Moira de Trabalho

6 comentários:

  1. Moira, vamos ter pano para mangas...ou seja, isto vai dar discussão e da boa !E quanto a um consenso, desde já sentencio, nunca haverá.Creio que um dos pontos mais citado será o da ausencia da calçada, incómoda é certo quando mal aplicada mas pergunto eu, não poderia conviver em parcela mesmo que pequena com um novo e moderno piso?
    E porquê ocupar em permanencia o espaço vazio? As arcadas e a extensão exterior com bonitas esplanadas apoiadas igualmente por esculturas, comprovadamente dezenas de propostas e soluções.
    Enfim, é tema que merece e deve por todos ser visto, revisto,analisado, discutido.
    Mas acima de tudo, o meu agradecimento a Moira de Trabalho por trazer a lume um tema profundamente entusiasmante quer para os apenas amantes de Lisboa quer sobretudo para os seus habitantes.

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  2. Despojem o Terreiro do Paço. Deixem-no respirar. Parem de inventar.

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  3. Por exemplo, a Praça de São Marcos, em Veneza, é completamente despojada, apenas com os Restaurantes e requintados Cafés debaixo das arcadas, que até têm pequenos conjuntos musicais, e é um must.
    Os turistas, as pombas, as fotografias da praxe, e nda mais...
    E o mesmo na Place de la Concorde, na Trafalgar Square, na Plaza Mayor...porquê complicar no nosso Terreiro do Paço?

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  4. ...eerr...porque como está [esteve até há 2 meses] não serve para nada?

    Quem lá vai tomar um café às arcadas?
    E mesmo os turistas, onde podem parar? A pé, no meio das pombas?

    Volta e meia, ainda me ouço dizer: vou ao Rossio tomar um café. E vou mesmo! Saio do Chiado, rolando Rua Garret abaixo e lá fico eu, numa esplanada vendo o Rossio desfilar.
    Por vezes intercalo com a Praça da Figueira, para ver os skaters em acção.

    Digam-me se posso fazer o mesmo no Terreiro do Paço porque, para ser franca, ainda não descobri como - e passo lá, de biciclete, várias vezes por semana!

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  5. Mais uma vez, deixem-no em paz. é lindo se estiver limpo, sem obras e despojado, caso contrário faz-me lembrar um electrodoméstico com um naperon por cima.

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  6. Completamente de acordo com a Q*. neste assunto, nada a acrescentar. :-)
    sou lisboeta, da parte ocidental da cidade, embora já não viva lá

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