terça-feira, 27 de outubro de 2009

Cenário da Ópera do Malandro

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Nem ela própria percebia o porquê de ter aceite o convite para ir visitar a Lapa à noite.
Ela, que em Portugal nem ao cinema ia com os amigos dos irmãos
( uns belos pedaços de asno, diga-se em verdade) nem sequer aos centros comerciais com as cunhadas( duas idiotas, acrescente-se) tinha aceite, à primeira e com um sorriso, o convite daquele carioca, com voz doce e ar malandro, que a apelidara de Deo, como nunca ninguém a chamara antes.
Para se justificar, dizia que era para agradecer os preciosos cinco dossiers que ele lhe entregara, demonstrando ter total confiança numa quase desconhecida.
Mas talvez fosse por, pela primeira vez na vida, Deolinda se sentir solta, livre e à vontade sem a presença da mãe, dos irmãos,
das cunhadas.
Sem ter que ser a ama seca do patrão, que mal vira nos poucos dias passados no Rio.
Falavam-se à noite, pelo telefone, cruzavam-se, por vezes, no café da manhã, e pouco mais.

A primeira impressão que teve da Lapa foi favorável.
Um Bairro Alto, onde só fora no decorrer de investigações,
mas mais alegre e cosmopolita.
Uma zona de prostituição, também aí parecida com o bairro lisboeta, transformada em local de peregrinação dos turistas e cariocas amantes do choro e do samba, que se faziam ouvir por entre as portas altas de velhas casas reformadas em bares, restaurantes e botequins da moda.
Quando Deolinda, ou Deo se preferirem, viu que Marcos não a convidava para nenhum daqueles locais de consumo, confirmou o que deduzira antes, ao ver que o policial carioca
nem sequer pedira um chôpe.
O dinheiro não abundava para aquelas bandas.
O que em vez de a afastar, a fez aproximar-se ainda daquela espécie em vias de extinção - um policialhonesto.
Caminharam até aos Arcos da Lapa, pegaram o bondinho
e subiram até ao bairro de Santa Teresa.
Um bairro antigo, onde muitos artistas têm os seus ateliers,
e restaurantes simpáticos ombreiam com galerias de arte naif, casas de souvenirs vendem artesanato urbano de forte colorido e o passear nas ruas de muros altos e portas coloniais, nos faz retroceder ao século passado, falando do XIX, claro.
Apesar do romantismo do local e do clima existente, como pessoas ligadas ao crime, não puderam deixar de trocar informações, entre si, acerca das personalidades que ocupavam os dossiers entregues por Marcos, horas antes.
Deo, em Roma sê romano, ficou a conhecer os ataques de violência de Sérgio, o sadismo de Velic e a fidelidade canina de Miltinho.
Em troca, a portuguesa contou pormenores da vida da ex-modelo, nada de muito excitante, convenhamos.
Cansados de calcorrear as ruas íngremes com paralelepípedos a lembrar Lisboa, sentaram-se e pediram duas bebidas que, Deolinda se apressou a pagar, apesar da tentativa de Marcos de a impedir.
Mas a notícia, na televisão, fê-los ficar de copos suspensos.

“Notícia de Última Hora. Mais uma jovem, desta feita massagista, foi encontrada assassinada com grande crueldade. Junto ao corpo um pequeno galo…”

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8 comentários:

  1. Sempre a crescer a "tensão"...
    Imagino que mais galitos vão aparecer!
    E a Rosa Ramalho que já nã está entre nós...

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  2. Enquanto continuar a visita guida, não me importo que aumentem as mortes "virtuais"...

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  3. A Lapa, e a própria Santa Teresa, estão cada vez mais na Moda...

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  4. Pressinto que se está a aproximar do final, ou estarei enganada?

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  5. Esta Deolinda ainda nos vai surpreender na versão Deo.

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  6. Deo, sem essa de ser ama seca do patrão, tu ignora Marcos, tu cai fora do bondinho, tu se desliga do romantismo local e do clima existente, tu salta no primeiro avião da Varigui que tu vir no Galeão (só porque a TAP agora se chama de 'Take Another Plane'), e tu volta p'ra cá, estás perdoada, moça !


    P.S.
    Assassinar feitas massagistas com grande crueldade até que nem me parece uma ideia assim tão má...




    Parabéns, J.V..



    :-))

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  7. Deu a louca na galera? Todo mundo virou brasileiro?

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  8. Sapho, isto é o meu relatório minoritário:

    Sem o Brasil, o futuro de PT é tão michuruquinha que nem Deus fez....


    :-)

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