quarta-feira, 1 de julho de 2009

O Cata Vento

Era uma vez um Príncipe que vivia num belo palácio rodeado de jardins com grandes árvores e não muito longe de uma longa praia, há muito afastado dos tempos em que não resistia aos olhares provocadores e admiradores da sua marcante figura e porte. Outros tempos, digo eu que bem o conheci e até acompanhei em passos perdidos.

E tinha um lago onde nadava amiúde, não porque apreciasse o exercício físico mas apenas por força das recomendações dos seus médicos.

Vivia feliz acarinhado pela Família, onde os seus três rebentos, dois deles gémeos, alegravam e desarrumavam todos os cómodos e iam provocando alguma destruição nos jardins pois a bola era uma das brincadeiras preferidas.

O jardineiro não tinha mãos a medir. Por vezes até havia que recorrer a um velho carpinteiro e então quanto a vidros, a despesa mensal assustava e preocupava os conselheiros e sobretudo a amada Esposa,

Ela viera de uma Ilha longínqua, verdejante e pacata mas com o seu bom feitio foi-se habituando ao reboliço do Palácio e às tropelias das crianças, agora bem iniciados na adolescência e carregadas com os mimos do Pai babado.

De vez em quando organizavam-se passeios aqui e ali, alguns com fins didácticos outros apenas na base do divertimento à mistura com uma imprescindível socialização.

Um belo dia, o Príncipe decidiu que era altura de se dedicar à lavoura, coisa que no seu belo jardim seria impensável. E percorrendo o interior do país, achou e encantou-se com umas largas dezenas de hectares e uma casinha imaculadamente branca com o característico rebordo em azul nas portas e janelas.

Casinha para ele porque na vizinha aldeia e sobretudo nas conversas tidas e havidas na taberna , todos lhe chamavam o casarão.

A compra foi fácil, a negociação amena pois o comprador com o seu semblante sorridente, a farta cabeleira embranquecida e um sorriso confiante, logo foi tido e achado pelo então proprietário como homem de bem e de grande seriedade.

Feita a escritura, a Família tomou posse do território no meio de grande alegria e de enorme ansiedade pelo prazer de usufruir da tranquilidade e dos frutos que o amanho das férteis terras lhes daria em breve.

O Príncipe que da terra apenas conhecia o cheiro, em breve se travestiu em agricultor sabido e conhecedor dos segredos das épocas e das semeaduras, ao principio com alguns fiascos mas aprendeu depressa como era seu timbre.

Os pequenos à medida que foram crescendo, iam conspirando para não serem deportados e condenados ao isolamento nas longínquas terras apesar dos confortos que se foram arranjando para os cativar.

A Mãe extremosa, encarava com bonomia o crescimento dos rapazes, as asas ganhando expressão e força para iniciarem os voos da natural independência mas sempre atentos à nova fase da vida de um Pai que de artista consumado se transformara em agricultor sabido.

Embelezando aqui, pintando acolá, cavando e regando quando necessário, os dias eram passados pelo Príncipe também com um olho nos jornais que comprava na vila e outro num computador que sempre o acompanhava.

Um belo dia em que a Mãe tinha ido comprar carne para fazer um churrasco, coisa que jamais haviam feito no Palácio , a surpresa no regresso não podia ter sido maior.

Empoleirado no telhado quase em risco de cair, o Príncipe pouco ou nada dado a exercícios físicos como já sabemos, acabara de colocar um cata-vento.

E que bonito.

Imitava na perfeição, um colorido Galo de Barcelos.

E assim nasceu a lenda sobre o Galo que ansiava pelo poder !


Carapau de Corrida

6 comentários:

  1. E se isto não é autobiográfico, então quem será que conhece assim tão bem a "lenda"?
    Gostei.

    ResponderExcluir
  2. Autobiográfico não é com toda a certeza, e tive muita relutância em publicar este MicroConto, como o Autor poderá confirmar.
    Prevaleceu o meu desamor à Censura e a grande amizade que tenho pelo criador do texto.
    Mas não sei se não estarei já arrependido...

    ResponderExcluir
  3. Confirmo.
    Mas valeu a publicação.
    O Galo merece.

    ResponderExcluir
  4. Não sei, não!!!
    Há muito tempo que deixei de acreditar em coincidências...
    No entanto... alguns de nós conhecem bem esta "lenda"!!!

    ResponderExcluir
  5. Olha a saudosa Contessa!!
    Terá voltado de camelo?
    Pois gostei muito de ver o nosso Galo biografado de uma forma quase subtil mas que dá nas vistas.
    A sua modéstia levada ao exagero, foi bem enfrentada por este Carapau desconhecido.

    ResponderExcluir
  6. De camelo ? Podia era ter vindo a pé...

    ResponderExcluir