quinta-feira, 18 de junho de 2009

Mudança de Estilo

Tinha sido, muitas vezes, acusado de arrogante e irritadiço
Quando ouvia críticas dos adversários ficava crispado, vermelho e respondia com desprezo, dando a entender que os outros não o entendiam, por deficiências intelectuais notórias.
Rodeava-se de medíocres e lambe botas, de maneira a brilhar, a sobressair da mediania geral.
Utilizava argumentos falsos, números adaptados e fazia promessas que sabia, de antemão, não poder cumprir.
Adorava planear grandes obras, megalómanas mesmo, sem ter a mínima ideia de como vir a pagá-las.
Estava, muitas vezes, no fulcro de histórias mal contadas, de enredos dúbios, de esquemas suspeitos.
A sua preparação académica levantava dúvidas.
A assinatura dos seus primeiros trabalhos, também.
A relação de alguns dos seus familiares com aprovações milionárias era, no mínimo, pouco clara.
A compra de casas de luxo, causava estranheza.
Mas mantinha uma atitude messiânica, de salvador da Humanidade,
sentindo-se a estrela guia daquele pequeno país que há tanto esperava
o seu D. Sebastião.
Discursava, fora de portas, numa mescla de linguajares, a que chamava línguas técnicas, mas que, de facto, nada se percebia.
Pelo contrário, cá dentro, o seu objectivo era bem claro – continuar no Poder, com maioria absoluta, para poder fazer o que bem lhe apetecesse.

Só que um dia…há sempre um dia.

Os eleitores fartos de tanta trapalhada, de tanta promessa, de tanto sacrifício.
Conscientes que os maiores fraudulentos eram sempre ilibados.
Que eram sempre as mesmas elites (?) a receberem os lucros.
Que era sempre a classe média a pagar as facturas, cada vez mais pesadas.
Que as grandes obras eram dadas aos compadrios habituais, em negócios de muitos milhões, divididos pelos parceiros do costume e pagos sempre
pelo trabalhador anónimo.

Nesse dia, o povo deu um sinal claro de que queria mudança.
Que já não acreditava no sorriso fácil, nos gestos largos, no porreiro pá…

E o que fez a criatura, perante isso?
O que alterou o sujeito perante as críticas, as sugestões, as alternativas ?
Mudou de políticas? Fez mudanças na equipa ?
Definiu novos objectivos e prioridades ?

Não, trocou a gravata por uma mais colorida.
Mudou, ligeiramente, de penteado.
E apresentou-se com um sorriso ainda mais patético,
e uma vozinha, aparentemente, mais humilde:
- Dêem-me a Maioria Absoluta. Deixem-me salvar o País.

Maria Papoila

7 comentários:

  1. Maria Papoila, o seu conto está na linha do meu sentir e por isso reclamo para mim a possibilidade de lhe fazer desmesurado elogio. Merecido.

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  2. Porque é que agora começaram todos a bater no desgraçado ?

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  3. Talvez porque o desgraçado já ande a bater em nós, há demasiado tempo.

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  4. Realmente a tentativa de moderar a agressividade no tom de voz, de adoptar uma atitude mais humilde, de protelar o que antes dissera ser inadiável, de avançar com a hipótese de mudanças no Governo, etc, etc...é tão óbvia que já não convence ninguém.
    O problema é que a alternativa também não é grande coisa !!!

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  5. Margarida Ferreira dos Santos18 de junho de 2009 às 12:12

    Conteúdo à parte, Maria Papoila acho que o escreveu se aproxima mais de uma crónica do que de um microconto ou de um conto...

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  6. Continuo a gostar mais de fição.

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