Olá

- Olá! – disse ele.
- Tu?! – exclamou ela.
-E quem havia de ser? Eu...porquê o espanto, se todos os dias a esta hora nos encontramos. Todos os dias, todos... e sempre – “Tu?!” – Nesse tom exclamativo, a demonstrar surpresa... Surpresa? Porquê? Surpresa seria se não fosse eu, e então em vez do Tu, viria um olhar de espanto, um abrir e fechar a boca silencioso, como os peixes no aquário, um temor do desconhecido, do inesperado, do medo do novo, daquele caminho que não se queria percorrer, mas para o qual de súbito nos vimos atirados...
- Uhm?!! – fez ela com um ar pouco convencido.
- Uhm?... Uhm?!!!! – E porquê Uhm? – O tom dele era declaradamente inquisitorial.
- Sei lá – Respondeu ela com uma vozinha morna, digamos mesmo sensualmente provocadora
Um silêncio, incómodo foi descendo lentamente sobre os dois…
- Ficaste calada de repente…
- Foi…- murmurou ela como se estivesse em qualquer outro lugar.
- Passa-se alguma coisa? – Perguntou ele, desconfiado.
- Estava a pensar no que disseste há pouco. Se não fosses Tu , no olhar de espanto, no abrir e fechar da boca, no temor do desconhecido, no medo, no inesperado, no medo do novo, daquele caminho que não se queria percorrer, em tudo isso… Mas felizmente que és sempre Tu – disse ela – mas não disse, que às vezes lhe apetecia que assim não fosse.
- É verdade – disse ele – Eu!
- Pois é... – disse ela – sempre Tu...
E levantaram-se os dois da cama como faziam todas as manhãs.
Lá fora o Sol beijava a Estátua de D. João I que dominava praça.

Contos do Feeling Estranho