terça-feira, 16 de junho de 2009

Saudades das epopeias galácticas

Um dia teria de acontecer. Um desmentido.
Ao cabo de 40 anos de honrada actividade jornalística
cai-me na cabeça um desmentido.
E logo aqui, no espaço não menos nobilitado do Galo.
Em rigor, o desmentido não é propriamente um desmentido.
É um "desmentido" (assim, com aspas).

Explico: há semanas, a propósito da Gripe A (que, entretanto, ascendeu a um cenário de pandemia) e encerrando uma série de crónicas inspiradas no tema dos vírus, escrevi a frase seguinte: «Dark Vader esconde-se sob a máscara da invisibilidade absoluta.»
Passados dias, um renomado jornalista, tão geronte como eu e antigo companheiro de jornadas comuns, que se confessa visitante assíduo do Galo (freguesia selecta, eu sabia), fingindo não se ter apercebido do sentido alegórico da frase, arrasa-me: «O que se esconde sob a máscara do Dark Vader é o actor David Prowser, um gigante de dois metros e 130 quilos de peso!»
Para não restarem dúvidas, avisou que procuraria um divertido conjunto de registos fotográficos que me enviaria oportunamente.
Nesse documentário se revelava, lado a lado, os actores e respectivas personagens na histórica série d' A Guerra das Estrelas.
Promessa agora cumprida, como se verá nas imagens reproduzidas adiante.
Recorde-se que Dark Vader é a personagem representativa
por excelência da mitologia Star Wars.
O Lorde Negro do Sith, corpo e alma da perfídia.
Distinguiu-se em tempos como um intrépido guerrreiro Jedi mas traiu o seu mestre espiritual e colocou a Força ao serviço do Império do Mal.
Em combates inúmeros foi perdendo alguns dos seus órgãos, sucessivamente substituídos por elementos mecânicos.
George Lucas diria que a criação da figura de Vader originou um número de "abordagens plásticas" superior à dos restantes protagonistas.
Houve, desde o início do projecto, a ideia impositiva de que a personagem deveria incutir a sensação de uma prepotência malévola, a visão assombrosa do Mal, sem que o espectador pudesse identificar-lhe a fisionomia: «O maior tirano não desvenda o rosto.»
Um corpo ciborguiano (fusão de uma parte orgânica com outra cibernética) parecia adequar-se ao plano e prevaleceu.
Ralph McQuarrie, o talentoso cenografista do projecto, desenhou um vulto sinistro, inspirado nos trajes negros dos guerreiros samurais, e cumpriu o objectivo de impedir o reconhecimento do rosto mediante uma máscara pavorosa.
O próprio Lucas o descreveria nestas palavras: «Uma figura com vestes negras, soltas, roçando o chão, e a face coberta por uma máscara de respiração em metal negro, funcional, ainda que bizarra.»
Ao caminhar, dir-se-ia que desliza «como se andasse sobre trilhos.»
Definida a imagem, faltava encontrar o «corpo» que animaria o horrífico ser.
Lucas chamou para o efeito o ultravigoroso Prowser.
Por uma única vez se consegue ver, numa cena fugaz (morte de Vader), o rosto do actor.
Seria depois rejeitada a voz natural de Prowser,
considerada "branda" em função do ente colossal
e despótico que a personagem deveria transmitir.
Optou-se então pela voz de um outro actor,
também americano e mais conhecido, James Earl Jones.
Maior surpresa causará um discreto "artista na sombra" (literalmente!).
Sempre imaginei que um dos "robots" mais populares do Universo,
não sendo propriamente animado por meios robóticos,
o fosse por processos mecânicos.
Mas não.
O atarracado "robot" trípode R2-D2 (Artoo-Detoo)
tem no seu interior um anão de nome Kenny Baker.
A ilustração condoi-nos:
o suplício que ele terá passado dentro daquela barrica metálica!
Por último, o companheiro de Artoo,
mas de concepção humaniforme: C-3PO (Threepio).
Sob o seu invólucro áureo está o actor Anthony Daniels,
sendo dele próprio a voz maviosa
em que se exprime o "robot" paternal e um tanto medroso.


Registo uma confidência de despedida por parte do meu colega:
«Que saudades destes filmes do velho Lucas!»
Acrescento: que saudades do tempo passado
em extensíssimas filas a aguardar uma hora ou mais
para conseguir uma entrada no cinema!
O Bem e o Mal confrontavam-se então
na mais elementar visão maniqueísta,
como nas epopeias cavaleirescas.
A bondade dos bons é tanto maior quanto a maldade dos maus.
Dos maus exige-se uma malignidade suprema.
De contrário não poderão os bons desagravar,
em combates cintilantes e mortais, a honra, a justiça,
a paz, a liberdade ofendidas.
Este preceituário garante sempre um bom espectáculo.
Mas, nos anos 70, a apoteótica imaginação de George Lucas
e o emergente delírio criativo dos efeitos visuais
davam às epopeias um sabor inesquecível.






Pedro Foyos
Jornalista

3 comentários:

  1. Eu como fã incondicional da Guerra das Estrelas adorei este post.
    Obrigado e parabéns, Pedro Foyos.

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  2. Mas também a mim que não aprecio ficção ciêntifica me agradou este texto informativo.

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  3. Tenho várias edições de coleccionador da Star Wars, conhecia a quase totalidade dos pormenores mencionados, mas, mesmo assim, gostei bastante deste post. Só é pena que o autor pareça tão esporadicamente.
    Para quando um MicroConto?

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